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Mensagem ao Congresso Fundacional da Coordenação Anarquista Brasileira

category brazil/guyana/suriname/fguiana | movimento anarquista | comunicado de imprensa author Friday June 01, 2012 03:46author by Federação Anarquista Gaúcha - FAG Report this post to the editors

O anarquismo organizado no Brasil viverá nos dias de junho, no Rio de Janeiro, seu maior acontecimento histórico contemporâneo. O Congresso Anarquista que reunirá grupos de cerca de 10 estados do país em debates, acordos e resoluções para atuar em princípios e táticas comuns sobre a realidade brasileira tem um significado muito especial. Nossa convicção, em mais de 10 anos de processo, diz que o anarquismo militante tem irrenunciáveis aportes para as lutas por uma mudança social anticapitalista. [Français] [Ελληνικά]
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O anarquismo organizado no Brasil viverá nos dias de junho, no Rio de Janeiro, seu maior acontecimento histórico contemporâneo. O Congresso Anarquista que reunirá grupos de cerca de 10 estados do país em debates, acordos e resoluções para atuar em princípios e táticas comuns sobre a realidade brasileira tem um significado muito especial. Nossa convicção, em mais de 10 anos de processo, diz que o anarquismo militante tem irrenunciáveis aportes para as lutas por uma mudança social anticapitalista. A reunião das forças militantes que encarnam uma mesma concepção de trabalho em Coordenação é passo fundamental na jornada de construção político-organizativa que não começa agora.

Nossa ideologia se vincula historicamente com a luta dos povos e das classes oprimidas, com suas experiências, sacrifícios e projetos de emancipação do sistema capitalista. Contra as relações de dominação em todas as esferas da prática social se fez crítica radical, implacável; contra as estruturas de poder que produzem e reproduzem a sociedade de classes, se fez proposta de cambio revolucionário; contra as violências e os controles do estado, a exploração dos patrões, as ideias opressoras que circulam no corpo social, se fez ação militante intransigente.

Somos parte de um esforço de gerações do movimento socialista dos trabalhadores que não começa e nem termina com nós. Continuadores daquelas ideias e valores, de suas vigentes orientações para não cair nas capturas dos sistema, dos companheiros e companheiras anarquistas que deram suas vidas nos dramas e nas batalhas do antagonismo social dos inícios da classe operária. Somos parte também de um povo e de um chão, de uma formação sócio-cultural, de uma história singular onde a resistência dos povos nativos, dos escravos, do proletariado, os pobres e oprimidos do poder dominante, deixaram rastros de sangue rebelde em suas gestas.

O capitalismo, o Estado e toda a estrutura ideológica articulada ao sistema sempre foram duros algozes do anarquismo, como todos seus opositores radicais. No Brasil não poderia ser diferente. Durante a 1° república fomos enfrentados a conjunturas de fortes ações judiciais e repressivas que destruíram organizações, veículos de imprensa, atividades populares. Tivemos o doloroso desterro, encarceramento e a liquidação de vidas militantes que não tem preço em nossa causa.

O capitalismo dependente brasileiro variou seus modelos operativos para conservar o núcleo duro dos seus elementos sistêmicos. O projeto libertário lutou com grandes dificuldades a partir da década de 30 para atuar politicamente num contexto histórico-social de cambio da mentalidade das massas, disputando com o oportunismo dos bolches e o peleguismo trabalhista entre o proletariado. Estava em cena o crescimento econômico industrial articulado a uma estrutura jurídico-política assimiladora de certos conflitos do trabalho, que controla repressivamente os rebeldes, castradora das liberdades de ação do vetor classista dos sindicatos. Novas tecnologias de poder dirigidas por um modelo de dominação burguês-autoritário que vinculava as classes dominantes e um expressivo setor operário-popular.

Nosso campo de atividades ficou reduzido, reprimido, recuado, por fatores que sumariamente procuramos indicar, durante décadas. Para fazer justiça, é preciso dizer que no curso desta longa noite para o anarquismo tivemos companheiros e companheiras que, num esforço incansável, pelearam para manter vivo suas ideias em projetos de organização, periódicos, centros de estudo e cultura social, atuação em setores do movimento dos trabalhadores, entre estudantes, etc.. tarefa ingrata que lavrou terreno para a posteridade. Pelas esquerdas, o “socialismo real” do leste europeu, revoluções asiáticas, o exemplo vitorioso em nosso continente da Revolução Cubana, davam um fantástico poder de atração para as ideias marxistas. Todo o universo de valores, discursos e referências da guerra fria atravessavam a luta de classes com a bipolaridade e esmagavam posições alternativas.

Entre os agitados anos da transição da ditadura civil-militar para o regime representativo burguês, os fins de 70 revivem o anarquismo em lutas sociais com novos meios de propaganda e ação. Uma nova geração se mistura com a experiência dos velhos militantes, que já não são muitos. Volta a pauta a reorganização dos centros de cultura, as tarefas com a difusão da crítica social e as propostas libertárias. Em distintos lugares do país existem militantes atuando no movimento estudantil, lutas sindicais, com alguma responsabilidade em atividades populares. As concepções do trabalho político, de prioridades e objetivos para encararem comum, de mecanismos federativos para assegurar um funcionamento regular, neste momento, estão muito confusas. Há um espírito geral de “síntese”, circunstanciado pela esperança de unir o pouco que se tem, recuperar forças para a identidade anarquista juntando todos que se reconhecem nela.

O tema da organização e de mecanismos mais estruturados para a ação reaparece em uma conjuntura histórica em que a luta pública de massas se derrama pela transição burguesa até a nova legalidade democrática e faz emergir na cena nacional os movimentos sociais, a classe operária, os sem terras. O novo sindicalismo que se organiza pelas bases e oposições sindicais contra os pelegos e as velhas estruturas corporativas é uma força social de avançada na luta política por reformas sociais para além do modelo democrático gradual e controlado das classes dominantes. A estratégia do sindicalismo revolucionário nos inícios do século XX e a fundação histórica da Confederação Operária Brasileira são os maiores referentes de ação social para o anarquismo neste momento. Os conceitos de orientação para o trabalho nos anos 80 se apoiam, para um grupo importante de militantes, nessa experiência sindicalista, em suas memórias, seus valores e conquistas sociais.

Vale dizer que são conceitos mesclados com o contemporâneo, com o que é vivido neste momento, também com os exemplos que mais atraíam da luta libertária internacional e a voz de seus organismos oficiais. A constituição em meados da década de um grupo de apoio a AIT formou uma vertente predominante na militância da luta de classes em torno das concepções do anarcosindicalismo. O projeto dos núcleos pela reconstrução da COB teve seus anos de trabalho franco, suas dignas lutas, periódicos, instâncias nacionais, esforços organizativos vários. Mas não alcançou seus objetivos e ao longo do tempo foi se desagregando pelas debilidades de uma formulação, pensamos nós, que estava deslocada no tempo e no lugar em que se atuava. O anarcosindicalismo, versão pró-COB, jogava nossas poucas forças na contra-corrente e pra fora de um amplo movimento sindical de base que unia a classe e tinha que ser participado com os nossas táticas e princípios.

Nos anos 90, o capitalismo aplica com mão pesada o modelo neoliberal no nosso país através dos governos de turno e as receitas dos seus organismos internacionais. O Brasil se vende para a globalização, a ação capitalista feroz dos mercados, o econômico como ideia dominante na estrutura social, as políticas de ajuste fiscal, privatizações, dependência sinistra dos poderes financeiros. Vida precária, desemprego, a pobreza, toda a estrutura da desigualdade social investem pesado em nossa formação social. O campo popular detém seu avanço e defende a duras penas os direitos conquistados, os bens e serviços públicos que atendem pela questão social. Em geral se vive uma inflexão conservadora nas ideias e práticas sociais. A esquerda reformista formada na nova república, com a liderança do PT, gradualmente se integra nas estruturas do poder, nos controles institucionais e seu jogo de reprodução do sistema.

Neste período o setor mais inquieto do anarquismo procura se reorganizar e ter propostas para a realidade brasileira, o presente histórico, suas condições e possibilidades concretas. Se abre uma etapa de renovação crítica, de gestação de uma vontade organizada que busca de peito aberto soluções para atuar em dia com a história, com os problemas atuais, sem repetição de esquemas. A FAU inspirou e apoiou sua formação. É uma experiência anarquista latino-americana que teve a capacidade política de lutar em distintas conjunturas históricas e não deixar o projeto libertário perder um lugar entre os oprimidos e seus concretos contextos sociais. O Processo de Construção Anarquista Brasileiro (PCAB), nascido na metade dos 90, apontou os primeiros elementos da definição especifista que hoje nos reúne para um congresso Anarquista. Tinha ambições que não foram correspondidas, acusou limites e precipitou atos que não não tinham suficiente acumulação para serem tomados. Criou a OSL, uma organização de curta duração. De todos os modos, uma parte de nossa geração, da experiência política que viemos construindo dos anos 90 para cá, deve seu amadurecimento a esse intento. A essa busca do anarquismo militante por sua organização específica e a construção de força social por dentro da vida e das pautas dos “de baixo”.

O processo que temos hoje é diferente. Aprende com as pedras que se atravessaram pelo caminho, para não tropeçar nos mesmos limites. Toma os conceitos de orientação que ao longo do tempo se fizeram vigentes: ação sindical-popular articulada com o trabalho de uma organização política anarquista. Um projeto finalista libertário que reúna as capacidades e propostas para estar inserto no presente, para pensar com um discurso aberto ao nosso tempo social e atuar com certezas ideológicas que não transigem com os valores do sistema.

O FAO arranca praticamente junto com o período que marca a chegada do PT ao governo nacional, com Lula presidente. São dez anos percorridos em um tempo que tem sua singularidade. O reformismo que dirigia as lutas sociais-políticas dos 80 se credencia para administrar as instituições burguesas com uma política conciliada com os grandes poderes da estrutura global de dominação. As organizações populares e sindicais filiadas a esta estratégia se arranjam burocraticamente nos aparelhos do Estado. O governo refresca o modelo dominante, atualiza os controles com ambiguidades, com zonas pardas da colaboração de classes. Combina políticas de continuidade das receitas neoliberais com um pacto social de tintas desenvolvimentistas que leva compensações para os pobres. É um modelo de altos ganhos para as oligarquias e os grandes capitais, de coalizão política com velhos setores da direita, de integração relativa de setores populares. Que não faz mudança estrutural nos controles da riqueza e do poder. Coexiste com uma etapa fragmentária da luta de classes, de pouca acumulação combativa, de reorganização de um mundo do
trabalho e da pobreza que anda disperso e vinculado hegemonicamente as ideias dominantes.

O desenvolvimento capitalista não é alternativa para a emancipação dos oprimidos, nunca o foi. O sistema e seus elementos internos tem uma lógica brutal e perversa que não favorecem projetos de mudança real. O crescimento econômico que experimenta o Brasil é o crescimento do capital e os poderes dominantes, a exploração do trabalho precário, os lucros da banca, as exportações do agronegócio, a espoliação do território e do meio ambiente do povo. Toda a compensação social é marginal e controlada dentro destas estruturas da dominação. O mundo atual está emparedado por um escandaloso assalto dos bancos e os fundos abutres, de toda a classe da propriedade privada, que fez a trampa financeira estourar a conta da farra capitalista nos pobres.

Esse sistema criminal castiga milhões de trabalhadores com desemprego, produz condições de vida precária, guerras imperialistas, opressões e misérias crescentes. A situação geral repõe a urgente e necessária atuação de projetos que acumulem forças antagonistas, incorporem elementos radicais de cambio no imaginário coletivo, que façam caminho para uma alternativa socialista. Nossa corrente libertária, historicamente tem sido um fator ideológico a favor de novas relações sociais, onde o socialismo e a liberdade formam um horizonte irrenunciável. O Congresso que reúne as forças do anarquismo organizadopisa nesse terreno.

A Coordenação Anarquista Brasileira deve organizar os elementos para construir uma definição estratégico-tática que tenha inserção forte no tempo histórico que nos toca viver e lutar. Tem que ser um âmbito militante que se faça sentir como força coletiva, solidária e peleadora, mais capaz de atuar. Com estratégias para defender um programa de ações que parte deste momento, dos seus conflitos específicos e gerais, que caminhe junto com os trabalhadores e o povo. Sempre com os que lutam!

Mas acima de tudo que leve no curso de suas experiências mecanismos de fortalecimento, de rupturas, de poder popular.

Ao Congresso!
10 anos do FAO.
Viva a Coordenação Anarquista Brasileira.
Pelo Socialismo e pela Liberdade!

Federação Anarquista Gaúcha

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