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Bakunin, Malatesta e o Debate da Plataforma

category internacional | história do anarquismo | feature author Monday June 01, 2015 18:49author by Felipe Corrêa e Rafael Viana da Silva Report this post to the editors

A questão da organização política anarquista

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No sentido horário, a partir de cima, à esquerda.: Bakunin, Malatesta, Arshinov, Makhno

Nesse artigo, os autores realizam uma discussão da organização política anarquista. Partem das contribuições relativas ao tema de Mikhail Bakunin e Errico Malatesta mostrando que há similaridades entre elas e a da Plataforma Organizacional da União Geral dos Anarquistas. Conforme apontam, Bakunin constitui a base teórica da Plataforma e Malatesta possui posições que alguma vezes aproximam-se dela e outras da Síntese Anarquista.

Consideram, assim, que nenhuma das posições em questão pode ser coerentemente inscrita no campo do marxismo/bolchevismo ou de um suposto “anarcobolchevismo”. Os autores analisam o debate entre Malatesta e Nestor Makhno sobre a Plataforma mostrando onde, realmente, estão as divergências entre ambos. Por meio de uma reflexão histórica do impacto da Plataforma, demonstram como as críticas estabelecidas nos anos 1920, em grande medida realizadas por leituras ideologizadas, somadas a duas experiências práticas dos anos 1950 e a hegemonia francesa na discussão do tema, vêm pautando erroneamente o debate.

O presente texto – cujo cerne foi retirado da introdução que escrevemos para a edição em francês de Anarquismo Social e Organização, da Federação Anarquista do Rio de Janeiro[1] – tem por objetivo discutir a questão da organização política específica anarquista, a partir das contribuições de Mikhail Bakunin, Errico Malatesta e da “Plataforma Organizacional da União Geral dos Anarquistas”, escrita pelos militantes articulados em torno da revista Dielo Truda, dentre os quais se encontram Nestor Makhno e Piotr Arshinov.[2]

Para tanto, retomaremos contribuições de Bakunin e de Malatesta e estabeleceremos um diálogo entre elas e a Plataforma, especialmente por meio do debate entre Malatesta e Makhno/Arshinov. Discutiremos, também, similaridades e diferenças entre os anarquistas que defendem o dualismo organizacional e os bolcheviques, as aproximações de Malatesta com a Síntese, assim como o impacto histórico da Plataforma, que permitirá elucidar as posições que vêm sendo difundidas acerca desse debate.

***


Conforme demonstram Michael Schmidt e Lucien van der Walt em Black Flame: the revolutionary class politics of anarchism and syndicalism – livro em que levam a cabo uma análise teórico-histórica do anarquismo tomando em conta toda sua trajetória nos cinco continentes –, o anarquismo, como uma ideologia político-doutrinária que emerge durante o século XIX, teve hegemonia das estratégias de massa, em especial o sindicalismo de intenção revolucionária (sindicalismo revolucionário e anarco-sindicalismo).

Dentre as posições fundamentais do “anarquismo de massas” estão: a defesa da organização, das reformas como possível caminho para a revolução (se devidamente conquistadas por meio da luta de classes) e a utilização da violência devidamente associada a movimentos populares previamente articulados. Tais noções distinguem-se de outras, comuns, ainda que minoritárias: antiorganizacionismo, posição contrária às lutas por reformas e violência utilizada como gatilho para a mobilização popular (“propaganda pelo fato”).

Aqueles que tomaram parte no anarquismo de massas e que defenderam o dualismo organizacional – a organização concomitante em dois níveis, um político e anarquista e outro social e de massas – não foram maioria. Entretanto, dentre eles há autores relevantes, posições significativas e, principalmente, uma experiência histórica sólida, apoiada na construção teórica e prática de organizações anarquistas.[3]


Contribuições de Bakunin

Apesar das obras completas de Bakunin terem sido publicadas recentemente em francês – na edição de 2000 do IIHS de Amsterdã, depois de tentativas importantes de compilar parte significativa de sua obra –, seus escritos sobre as chamadas “Fraternidade”, de 1864, e “Aliança”, de 1868, para utilizar a terminologia proposta por Max Nettlau, são pouquíssimo conhecidos.

A estratégia de massas de Bakunin vem sendo melhor discutida, em textos relevantes como, por exemplo, Bakunin: fundador do sindicalismo revolucionário, de Gastón Leval[4] e vários outros de René Berthier.[5] No entanto, sua teoria da organização política, amplamente abordada em documentos escritos com o intuito de fundamentar – em termos de princípios, programa, estratégia e organicidade – suas propostas político-organizativas, é pouco ou quase nada discutida.

Parece haver, em especial entre os anarquistas franceses, certo constrangimento desses escritos, como se constituíssem parte de uma herança autoritária, talvez de inspiração blanquista e jacobina, que permaneceu no pensamento do autor e que não deveria ser trazida a tona.[6]

Consideramos que as posições de Bakunin sobre a organização política anarquista, de 1868 em diante, podem ser conciliadas plenamente com sua estratégia de massas, proposta para a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), e, assim, ser considerada parte relevante de seu anarquismo. Tais posições parecem ter força, ainda hoje, para subsidiar reflexões frutíferas acerca do modelo organizativo mais adequado para uma intervenção anarquista na realidade.

Bakunin sustentou que a Aliança da Democracia Socialista (ADS) deveria ter um duplo objetivo; por um lado, estimular o crescimento e o fortalecimento da AIT[7] ; por outro, aglutinar em torno de princípios, de um programa e de uma estratégia comum, aqueles que tivessem afinidades político-ideológicas com o anarquismo – ou, como em geral se chamava à época, do socialismo ou coletivismo revolucionário.[8] Em suma, criar/fortalecer uma organização política e um movimento de massas, o dualismo organizacional:

“Eles [os militantes da ADS] formarão a alma inspiradora e vivificante desse imenso corpo a que chamamos Associação Internacional dos Trabalhadores [...]; em seguida, se ocuparão das questões que são impossíveis de serem tratadas publicamente – eles formarão a ponte necessária entre a propaganda das teorias socialistas e a prática revolucionária.”[9]

Para Bakunin, a ADS não precisaria ter uma quantidade muito grande de militantes: “o número desses indivíduos não deve, pois, ser imenso”; ela deveria constituir uma organização política, pública e secreta, de minoria ativa, com responsabilidade coletiva entre os integrantes, que reunisse “os membros mais seguros, os mais devotados, os mais inteligentes e os mais enérgicos, em uma palavra, os mais íntimos”, nucleados em diversos países, com condições influenciar determinantemente as massas trabalhadoras.[10]

Essa organização deveria ter por base comum um regulamento interno e um programa estratégico, os quais estabeleceriam, respectivamente, seu funcionamento orgânico, suas bases político-ideológicas e programático-estratégicas, forjando um eixo comum para a atuação anarquista.

Poderia tornar-se membro da organização somente “aquele que tiver francamente aceitado todo o programa com todas suas consequências teóricas e práticas e que, junto à inteligência, à energia, à honestidade e à discrição, tenham ainda a paixão revolucionária”.[11]

Internamente, a organização política bakuniniana não possui hierarquia entre os membros e as decisões são tomadas de baixo para cima, em geral por maioria (variando do consenso à maioria simples, a depender da relevância da questão), e com todos os membros acatando as decisões tomadas coletivamente. Isso significa aplicar o federalismo – defendido como forma de organização social, que deve descentralizar o poder e criar “uma organização revolucionária de baixo para cima e da circunferência ao centro” – nas instâncias internas da organização anarquista.

Externamente, a ADS não deve exercer relação de dominação e/ou hierarquia sobre a AIT, mas a complementar; o inverso também seria verdadeiro. Juntas, essas duas instâncias organizativas se complementam e potencializam o projeto revolucionário dos trabalhadores, sem a submissão de qualquer uma das partes.

“A Aliança é o complemento necessário da Internacional... – Mas a Internacional e a Aliança, tendendo para o mesmo objetivo final, perseguem ao mesmo tempo objetivos diferentes. Uma tem por missão reunir as massas operárias, os milhões de trabalhadores, com suas diferenças de profissões e países, através das fronteiras de todos os Estados, em um só corpo imenso e compacto; a outra, a Aliança, tem por missão dar às massas uma direção realmente revolucionária. Os programas de uma e de outra, sem serem de modo algum opostos, são diferentes pelo próprio grau do seu desenvolvimento respectivo. O da Internacional, se tomado a sério, contém em germe, mas somente em germe, todo o programa da Aliança. O programa da Aliança é a explicação última do [programa] da Internacional.”[12]

O dualismo organizacional bakuniniano caracteriza-se pela união dessas duas organizações – uma política, de minorias (quadros); outra social, de maiorias (massas) – e sua articulação horizontal e permanente potencializaria a força dos trabalhadores e aumentaria as chances do processo de transformação social com fins anarquistas.

Dentro do movimento de massas, a organização política dá mais eficácia aos anarquistas nas disputa de posições e na construção de um projeto revolucionário. Ela contrapõe, organizadamente e em favor de seu programa, forças que agem em sentido distinto e que buscam: elevar à condição de princípio uma das diferentes posições político-ideológicas e/ou religiosas, minimizar seu caráter eminentemente classista, fortalecer as posições reformistas (que veem as reformas como um fim) e a perda de combatividade do movimento, estabelecer hierarquias internas e/ou relações de dominação, direcionar a força dos trabalhadores para as eleições e/ou para estratégias de mudança que envolvam a tomada do Estado, atrelar o movimento a partidos, Estados ou outros organismos que retiram, neste processo, o protagonismo das classes oprimidas e de suas instituições.


Contribuições de Malatesta

Diversas concepções de Malatesta assemelham-se às previamente expostas[13] , em especial, um conjunto de proposições organizativas sobre o “partido anarquista” – nome que este autor utilizava para referir-se à organização específica anarquista. “Partidos” desse tipo tomaram corpo historicamente e contaram com sua participação, como foram os casos do Partido Revolucionário Socialista Anarquista, de 1891, do Partido Anarquista de Ancona, de 1913 e da União Anarquista Italiana, de 1919-1920.[14]

Malatesta conceituou o partido anarquista como “o conjunto daqueles que querem contribuir para realizar a anarquia, e que, por consequência, precisam fixar um objetivo a alcançar e um caminho a percorrer”. Para ele, “permanecer isolado, agindo ou querendo agir cada um por sua conta, sem se entender com os outros, sem preparar-se, sem enfeixar as fracas forças dos isolados, significa condenar-se à fraqueza, desperdiçar sua energia em pequenos atos ineficazes, perder rapidamente a fé no objetivo e cair na completa inação.”[15]

Para que os anarquistas pudessem ser eficazes em sua ação, deveriam estabelecer uma estratégia comum, um programa e superar a forma dos grupos de afinidade sem contato com as lutas sociais. O objetivo do partido é assim esclarecido: “queremos agir sobre ela [a massa] e impeli-la ao caminho que acreditamos ser o melhor; mas como nosso objetivo é libertar e não dominar, queremos habituá-la à livre iniciativa e à livre ação.”[16] Esse caminho seria, evidentemente o da revolução social.

O partido malatestiano fundamenta-se na disciplina revolucionária e nos critérios de união. “Sem entendimento, sem coordenação dos esforços de cada um para uma ação comum e simultânea, a vitória não é materialmente possível”. Entretanto, “a disciplina não deve ser uma disciplina servil, uma devoção cega a chefes, uma obediência àquele que sempre diz para não se mexer”. Trata-se de uma disciplina revolucionária, que significa “a coerência com as ideias aceitas, a fidelidade aos compromissos assumidos, [...] sentir-se obrigado a partilhar o trabalho e os riscos com os companheiros de luta.”[17]

Os critérios de união estabelecem que não basta, como plataforma de associação, a autoidentificação como anarquista; ainda que desejasse ver todos os anarquistas unidos, Malatesta afirma: “não acreditamos na solidez das organizações feitas à força de concessões e de restrições, onde não há entre os membros simpatia e concordância real”. E continua: “É melhor estarmos desunidos que mal unidos”.[18]

A propaganda e a educação seriam atividades fundamentais a serem levadas a cabo pelos anarquistas. “Fazemos a propaganda para elevar o nível moral das massas e induzi-las a conquistar por si mesmas sua emancipação.” Entretanto, esta propaganda precisaria ser organizada e planejada: “a propaganda isolada, casual, que se faz constantemente para acalmar a própria consciência ou simplesmente para desafogar a paixão de discutir, serve pouco ou nada”. Para ele, “sementes lançadas ao vento” teriam significativa dificuldade de germinar e constituir raízes. Seria, assim, necessário “um trabalho contínuo, paciente, coordenado, adaptado aos diversos ambientes e às diversas circunstâncias”. Os anarquistas também deveriam investir na educação, “educar para a liberdade”, “elevar a consciência de sua própria força e de sua capacidade dos homens que estão habituados à obediência e à passividade”.[19]

Entretanto, a propaganda e a educação, sozinhas, não são suficientes. “Enganaríamos ao pensar que a propaganda é suficiente para elevá-los [os homens] ao patamar do desenvolvimento intelectual e moral necessário à realização de nosso ideal.”[20] Em relação à educação, critica os “educacionistas” que

“acreditaram e ainda creem, todavia, que por razão de propagarem a instrução, de defenderem o livre pensamento, a ciência positiva etc., de fundarem universidades populares e escolas modernas, pode-se destruir nas massas o preconceito religioso, a sujeição moral ao domínio estatal, a crença nos direitos sacrossantos da propriedade.”[21]

Na realidade, estas iniciativas são muito limitadas: “os educacionistas deveriam, assim, ver o quão impotentes são seus generosos esforços”. A consciência das massas não pode ser sensivelmente elevada e o ambiente não tem como ser transformado “enquanto durarem as condições econômicas e políticas atuais”.[22]

Assim, Malatesta propõe a realização de um trabalho de base e organizativo, a ser levado a cabo cotidianamente pelos anarquistas: “em tempos normais”, diz, é necessário

“realizar o trabalho amplo e paciente de preparação e organização popular e não cair na ilusão da revolução em curto prazo, factível somente pela iniciativa de poucos, sem participação suficiente das massas. A essa preparação, contanto que ela possa ser realizada em um ambiente adverso, há, entre outras coisas, a propaganda, a agitação e a organização das massas, que nunca devem ser descuidadas.”[23]

As atividades dos anarquistas organizados seriam, portanto, “propaganda do ideal; organização das forças populares; combate contínuo, pacífico ou violento, segundo as circunstâncias, contra o governo e os proprietários, para conquistar o máximo de liberdade e bem-estar para todos.”[24]


Bakunin, Malatesta e a Plataforma: “anarcobolchevismo”?

Antes de tudo, quando Bakunin desenvolveu sua práxis – e, assim, sua teoria e sua prática da organização política anarquista –, a qual influenciará diretamente Malatesta, Lênin estava nascendo e o bolchevismo demoraria anos para existir. Nesse caso, acusar o dualismo organizacional bakuniniano de “leninista” implica um lapso histórico considerável.[25]

Ao mesmo tempo, parece também problemático assumir que, por defenderem o dualismo organizacional, Bakunin, Malatesta e Lênin devem ser considerados parte de uma mesma corrente ou tradição político-ideológica, assemelhando-se em alguma medida. Como se sabe, este dualismo foi entendido e praticado de maneira muito distinta na tradição anarquista e na tradição leninista, incluindo suas variações trotskistas e outras. Qualquer texto canônico do marxismo-leninismo a este respeito – como, por exemplo, O Que Fazer? de Lênin[26] – deixa isso evidente. Para além do trabalho paralelo em dois níveis distintos, um do partido de quadros e outro dos movimentos de massas, não há maiores similaridades.

Bastante sinteticamente, podem-se apontar duas diferenças fundamentais entre a práxis organizativa de Bakunin e Malatesta e a de Lênin: estrutura interna da organização, relação entre organização e movimentos de massa.

Em primeiro lugar, a organização política anarquista possui democracia interna e as decisões são tomadas de baixo para cima. São seus organismos de base, ou mesmo os próprios militantes da base, que discutem e resolvem todas as questões na organização, visto que não há hierarquia entre os membros e nem a cisão direção-base. A organização política leninista, distintamente, baseia-se no “centralismo democrático”, que prevê um modelo organizativo hierárquico, com cisão direção-base, e mesmo que consulte a base para as decisões, quem de fato delibera é a direção, mesmo contra a posição da base. Não há, por isso, democracia interna e as decisões são tomadas de cima para baixo.

Muitas vezes se confunde a unidade de ação, defendida por um setor do anarquismo, com o centralismo democrático. O que marca a diferença entre as duas posições não é a obrigatoriedade em relação às decisões tomadas, comum em ambos os casos, mas quem toma as decisões e como elas são tomadas. Nas organizações anarquistas, todos participam e efetivamente deliberam sobre todas as questões (ainda que por maioria); nas leninistas, mesmo que haja consulta da base, quem decide e impõe hierarquicamente as decisões é a direção.

Em segundo lugar, a organização política anarquista funciona de maneira complementar aos movimentos de massa e não pretende impor qualquer relação de hierarquia e/ou dominação em relação a eles; sua função é fortalecer o protagonismo desses movimentos, já que as massas, no projeto anarquista, devem ser as responsáveis pela transformação social revolucionária. Essa organização é parte das massas e reúne um setor ideologicamente afim visando fortalecer sua posição nas disputas políticas. A organização leninista, diferentemente, considera que os movimentos populares possuem somente capacidade para as lutas de curto prazo, reivindicativas. É o partido que deve dotar-lhes de capacidade transformadora e, ele próprio, protagonizar a transformação social revolucionária. O partido é compreendido como um setor separado das massas e busca exercer relação de hierarquia e dominação em relação a eles, retirando-lhes a independência de classe e o próprio protagonismo.

Por isso, não concordamos com a afirmação de que essas posições de Bakunin e de Malatesta – resgatadas, a nosso ver e conforme argumentaremos, em vários de seus aspectos, pela Plataforma e por diversas organizações políticas anarquistas – constituam algum tipo de “anarcobolchevismo” ou que apresentem traços leninistas. Tanto Bakunin quanto Malatesta – e, posteriormente, Makhno, Arshinov, Ida Mett e outros – tiveram como um de seus importantes temas de reflexão a organização política anarquista estabeleceram seus marcos dentro dos princípios anarquistas. O vínculo estabelecido entre o dualismo organizacional anarquista e o leninismo, realizado com alguma frequência no passado e no presente, não possui qualquer fundamento historiográfico e nem mesmo teórico-lógico. Ele parece estar muito mais radicado nas lentes daqueles que o realizam, do que no fenômeno histórico em si.

Qualquer um que se debruce no tema com o mínimo de seriedade e honestidade intelectual verificará o descabimento desta relação de Bakunin, Malatesta e mesmo da Plataforma com o bolchevismo. No caso da Plataforma, seus principais aspectos baseiam-se na longa tradição política anarquista e seus autores viveram a experiência de uma revolução social concreta, esmagada pela política autoritária dos bolcheviques, o que só torna mais absurda a caracterização de seus autores como anarcobolcheviques.[27]


A Plataforma e o debate entre os anarquistas

“A Plataforma Organizacional da União Geral dos Anarquistas”, escrita por um grupo de russos/ucranianos exilados na França, em 1926, constitui um marco na discussão da organização anarquista. A nosso ver, o debate sobre este documento tem sido relativamente truncado e, por alguns motivos, incompreendido por parte significativa das pessoas que se interessam pelo tema.

Resultado de um processo de autocrítica dos anarquistas em função dos desdobramentos da Revolução Russa e Ucraniana, a Plataforma foi publicada como uma proposta de programa para os anarquistas. Dividida em três grandes seções – geral, construtiva e organizacional –, ela sustenta, entre outras noções: a crítica da sociedade capitalista, do Estado e da democracia representativa e a centralidade da luta de classes; a necessidade de protagonismo das massas na revolução, por meio de uma intervenção classista e federalista; a crítica da ditadura do proletariado como período de transição; a defesa do sindicalismo de intenção revolucionária como um meio relevante de ação anarquista; o estabelecimento de uma sociedade pós-revolucionária em que a produção e a terra tenham sido socializadas; a criação de órgãos para a defesa da revolução; a conformação de uma organização política anarquista programática pautada na unidade teórica e tática, na responsabilidade e no federalismo.[28]

Dois motivos podem ser apontados, no que tange à incompreensão da Plataforma, especialmente tomando em conta as contribuições de Bakunin e Malatesta anteriormente discutidas.

Em relação a Bakunin, a falta de conhecimento acerca de seus textos sobre a ADS tem impedido que se notem as similaridades entre a concepção de organização política de Bakunin e a Plataforma.

Em relação a Malatesta, a divulgação parcial e o enfoque excessivo em parte de sua troca de correspondências com Makhno acerca da Plataforma – especificamente, a primeira carta enviada pelo italiano – têm impedido a compreensão mais clara sobre as posições de Malatesta.

Há, ainda, um terceiro motivo, relacionado aos setores que têm pautado este debate no mundo e, em certa medida, estabelecido a versão sustentada por muitos pesquisadores e militantes. Parte significativa da discussão sobre a Plataforma vem sendo monopolizada pela interpretação dominante no anarquismo europeu em geral, e francês em particular, majoritariamente crítico à Plataforma.

Buscaremos, em seguida, discutir elementos que contribuam com nossa posição acerca dessas três relevantes questões.


Bakunin e os fundamentos da Plataforma

Compartilhamos com pesquisadores como Schmidt, van der Walt e Frank Mintz[29] , que a Plataforma, muito mais do que introduzir um novo debate organizativo entre os anarquistas, retoma elementos fundamentais da estratégia bakuniniana.

Schmidt e van der Walt afirmam corretamente que “Makhno e Arshinov ligaram explicitamente a Plataforma à herança bakuninista”. Citando C. M. Darch sobre a makhnovitchina, eles afirmam:

“As aspirações de Bakunin ‘relativas às organizações, assim como sua atividade na Primeira Internacional nos dão todo direito’ de enxergá-lo como um ‘ativo defensor’ da ideia que o anarquismo ‘deve unir suas forças em uma organização, em agitação permanente, conforme exigido pela realidade e a estratégia da luta de classes’.”[30]

Elementos fundamentais encontrados na Plataforma são certamente tributários de Bakunin. Dentre eles a crítica social à dominação capitalista e estatista e a centralidade da luta de classes, a necessidade de uma intervenção dos anarquistas simultaneamente em dois níveis, organização anarquista e movimentos de massas (dualismo organizacional), a necessidade de uma revolução social violenta e as linhas gerais do socialismo libertário como proposta de sociedade futura.

Mesmo que, em uma análise mais pormenorizada, possamos encontrar diferenças, há similaridade nas grandes linhas. O funcionamento federalista da organização anarquista, sem hierarquia ou dominação entre os membros, e sua relação complementar com os movimentos de massas, também são elementos marcantes, que permitem relacionar Bakunin à Plataforma. Não é esse o momento para tanto, mas seria possível, sem grandes dificuldades, estabelecer todos esses paralelos de maneira mais detalhada e bem fundamentada.

Assim, conforme a compreendemos e de acordo com o que mencionamos anteriormente, a Plataforma, longe de inovar, simplesmente propõe um “retorno”, mediante um contexto histórico concreto, à estratégia organizativa bakuniniana do período pós-1867. E devemos lembrar que este modelo tomou corpo, em termos teóricos e práticos, em diversas outras circunstâncias, nas mais distintas épocas e localidades, sendo a Plataforma somente um desses casos. Por esse motivo, compreendemos que o qualificativo “plataformista” – ainda que tenha o mérito de diferenciar, entre os anarquistas, uma estratégia organizativa particular – poderia, sem dificuldades, ser substituído por outros, que fizessem referência a outros autores, experiências, alguns dos quais apresentaram-se na primeira grande onda do anarquismo no mundo.


Malatesta, a Plataforma e a Síntese

Ao analisar a polêmica travada em torno da Plataforma[31] , na qual se destaca o debate Makhno-Malatesta, a aproximação entre Malatesta e a Plataforma não é evidente, distintamente do que ocorre com Bakunin. Conforme colocamos, tomando em conta as mais de seis décadas de anarquismo de Malatesta, há momentos em que suas posições são mais próximas da Plataforma e outros da Síntese Anarquista.[32]

Textos como os publicados em 1897, em L’Agitazione, em especial, “A Organização I” e “A Organização II”[33] , e compilações como Ideologia Anarquista[34] , permitem que se identifiquem posições bastante semelhantes às da Plataforma. Entretanto, textos como “Comunismo e Individualismo”[35] , “Individualismo e Comunismo no Anarquismo”[36] , assim como as intervenções de Malatesta no Congresso Anarquista de Amsterdã, em 1907[37] , possibilitam que se encontrem posições mais próximas da Síntese.

Nos textos mais próximos da Síntese, Malatesta critica o fato de que “anarquistas de várias tendências, apesar de quererem basicamente a mesma coisa, encontram-se em suas vidas diárias e em sua propaganda, numa feroz oposição uns aos outros”. Defende, a partir dessa crítica, a necessidade de “chegar a algum entendimento” e “quando o acordo não for possível, [...] saber como tolerar uns aos outros. Trabalhar juntos quando houver consenso e quando não houver permitir aos outros que ajam como acharem que for melhor, sem interferência.”[38] Isso deveria ser feito pois o “anarquismo comunista e individualista são somente uma coisa, ou quase a mesma coisa”; “não existem diferenças fundamentais”.[39]

No Congresso de Amsterdã, tentando intermediar as posições dos anarquistas sindicalistas e outros com influências individualistas, Malatesta afirmou: “a cooperação é indispensável, hoje mais do que nunca. Sem dúvidas, a associação deve permitir aos membros individuais completa autonomia e a federação deve respeitar essa mesma autonomia para seus grupos.” Se por um lado ele compreende ser “errado apresentar os ‘organizacionistas’, os federalistas, como autoritários”, por outro, “é igualmente errado imaginar que os ‘antiorganizacionistas’, os individualistas, tenham deliberadamente se condenado ao isolamento.” A disputa entre individualistas e organizacionistas seria uma “simples disputa de palavras”.[40]

Essas e outras posições permitiram que autores como Schmidt e van der Walt afirmassem corretamente que Malatesta “flertou com a posição sintetista em algumas ocasiões”.[41] Os autores também reconhecem que, apesar disso, há momentos em que defende posições bastante distintas.


O debate entre Makhno e Malatesta: esclarecimentos necessários

No que concerne ao debate entre Makhno e Malatesta sobre a Plataforma[42] , as posições de Malatesta também se modificam ao longo do debate, truncado por questões de contexto e de compreensão mútua.

Alguns aspectos relativos ao contexto devem aqui ser pontuados: o fato de Malatesta estar em prisão domiciliar (domicilio coatto) e bastante afastado das discussões anarquistas; o problema da tradução da Plataforma que, realizada por Volin, um de seus maiores opositores, foi “ajustada” ao seu ponto de vista por uma série de escolhas terminológicas[43] ; uma certa diferença na avaliação do anarquismo no período, sendo os russos muito mais críticos que Malatesta e, por isso, considerando necessária uma mudança mais significativa nos padrões organizativos anarquistas. Essa posição crítica também tem relação com a experiência histórica do anarquismo russo/ucraniano, em que seus progressos e derrotas contribuíram para reforçar a importância da organização específica anarquista e de seus eixos fundamentais.[44] Consideramos relevante discutir mais pormenorizadamente algumas questões desse debate.

Em primeiro lugar, devemos apontar que, para nós, sem dúvidas, tanto Malatesta, quanto Makhno e os outros russos que escreveram a Plataforma são anarquistas, tomando em conta uma abordagem histórica e global do anarquismo; ambas as posições podem ser mais ou menos identificadas historicamente em diversos autores e episódios anarquistas. Malatesta, principalmente em sua primeira carta, exagera e comete equívocos em sua crítica da Plataforma. Não há motivos para sua afirmação de que a Plataforma é “tipicamente autoritária” e que não constitui um documento do anarquismo, mas “um governo, uma igreja”, afirmação que Makhno negou-se a comentar, tamanho era seu descabimento. Malatesta ainda insinua que a Plataforma admite que “organizar-se significa submeter-se a chefes, aderir a um organismo autoritário e centralizador, que sufoca toda livre iniciativa”.[45] Para nós, não há dúvidas que a Plataforma é anarquista e não se relaciona com governos, igrejas ou qualquer tipo de autoritarismo; insere-se, sem qualquer dificuldade, dentro da tradição histórica do anarquismo e não implica, como foi acusada desde sua publicação por seus detratores, qualquer desvio bolchevique.

Em segundo lugar, há similaridades inquestionáveis entre as posições de Makhno e Malatesta, que concordam, por exemplo, sobre a necessidade de os anarquistas articularem-se em uma organização política revolucionária (“união geral” para o primeiro, e “partido anarquista” para o segundo). Ambos também concordam, excetuando a problemática terminológica envolvida[46] , que os anarquistas devem conceber sua organização de maneira a promover suas ideias e práticas entre as massas (e para isso usam termos como “influência”, “orientação”, “sugestão” ou mesmo “direção”), orientando os rumos das lutas e dos movimentos de trabalhadores para a revolução social e o socialismo/comunismo libertário.

Malatesta afirma:

“Acredito que nós, anarquistas, convencidos da validade de nosso programa, devemos nos esforçar para adquirir uma enorme influência e atrair o movimento para a realização de nossos ideais. Mas tal influência deve ser obtida fazendo mais e melhor do que os outros, e será útil apenas se a obtivermos dessa forma.”[47]

Makhno, similarmente, defende que “o anarquismo é uma doutrina social revolucionária que deve inspirar os explorados e oprimidos”[48] nas lutas pela transformação social, ou, como propõe a Plataforma, deve fazer penetrar as “posições anarquistas revolucionárias” nos movimentos de “trabalhadores e camponeses”; constituir-se como “pioneiro” e “guia teórico” das organizações populares das cidades e dos campos.[49] O “Suplemento à Plataforma” afirma que as ferramentas para a influência das massas devem ser: “a propaganda, a força da opinião, a argumentação pela palavra e os escritos”.[50]

Em terceiro lugar, devemos colocar que duas das críticas de Malatesta à Plataforma são completamente descabidas: que os russos estariam propondo uma organização hierárquica e que o Comitê Executivo (apesar do seu nome, que indica que ele executa e não delibera) deveria controlar as decisões da organização.

Não foi a toa que Makhno surpreendeu-se com o primeiro texto de Malatesta, dizendo: “minha impressão é que você não compreendeu o projeto da ‘Plataforma’”[51] , o que, convenhamos, em alguma medida é verdade.

A Plataforma é clara no que diz respeito às funções do Comitê Executivo:

“A execução das decisões tomadas pela União com as quais são confiados; a orientação teórica e organizacional da atividade de organizações isoladas consistente com as posições teóricas e a linha geral tática da União; a monitoração do estado geral do movimento; a manutenção das relações de trabalho e organizacionais entre todas as organizações da União; e com outras organizações.”[52]

Trata-se, a nosso ver, de um tipo de secretariado que encaminha as decisões tomadas pela base da organização.

A forma organizativa proposta é federalista, construída pela base, de baixo para cima, conciliando “a independência e a iniciativa dos indivíduos e da organização que servem à causa comum”. Contudo, para que as “decisões compartilhadas” – ou seja, socializadas entre o conjunto da militância e estabelecidas coletivamente – possam ser levadas a cabo, o federalismo exige que os militantes “assumam deveres organizacionais fixos e exige a execução de decisões compartilhadas”.[53]

Não há nada na Plataforma e nos documentos relacionados a ela que permita relacioná-la a um modelo de organização hierárquica ou com dominação (interna ou em relação às massas) e nem conceber o Comitê Executivo como um tipo de comitê central que decidiria os rumos da União Geral.


O debate entre Makhno e Malatesta: divergências reais

Neste momento, identificaremos questões que, realmente, tomando em conta todo o debate, constituem discordâncias reais entre ambos os militantes.

A questão que, sem dúvidas, ocupou a maior parte do debate foi a da responsabilidade coletiva. Para Malatesta, num primeiro momento, a ideia de que haveria uma responsabilidade mútua entre militante e organização (“toda a união será responsável pela atividade revolucionária e política de cada membro; e cada membro será responsável pela atividade revolucionária e política da união”[54] ) constituiria uma “absoluta negação de toda independência individual, de toda liberdade de iniciativa e de ação”.[55] Responsabilidade, para Malatesta, significa, neste texto, autonomia e independência dos indivíduos e grupos: “Total autonomia, total independência e, portanto, total responsabilidade de indivíduos e grupos.”[56]

Makhno, em sua primeira resposta, afirma que Malatesta sempre aceitou a responsabilidade individual dos militantes anarquistas: “você mesmo, querido Malatesta, admite a responsabilidade individual do revolucionário anarquista”[57] ; sua rejeição da responsabilidade coletiva seria, para Makhno, fundamentada na “falta de bases” e “perigosa para a revolução social”.[58] Makhno relaciona, ainda, a responsabilidade coletiva à questão da influência ideológica anarquista das massas:

“O espírito coletivo e a responsabilidade coletiva de seus militantes permitirão ao anarquismo moderno eliminar de seus círculos a ideia, historicamente falsa, de que o anarquismo não pode ser um guia – seja ideologicamente, seja na prática – para a massa trabalhadora num período revolucionário, e portanto não poderia exigir a responsabilidade total.”[59]

Arshinov, reforçando as posições de Makhno e criticando Malatesta, reforça o sentido da responsabilidade coletiva da seguinte maneira:

“A atividade prática de um membro da organização encontra-se naturalmente em plena harmonia com a atividade geral e, inversamente, a atividade de toda a organização não poderia estar em contradição com a consciência e com a atividade de qualquer um de seus membros, se ele aceitou o programa que funda a organização.”[60]

Uma organização anarquista só poderia fundamentar-se em tal princípio, visto que cada membro “não poderia realizar seu trabalho político e revolucionário senão no espírito político da União” e “sua atividade não poderia ser contrária ao que foi elaborado por todos os seus membros”.[61]

Na resposta seguinte, Malatesta relativiza e, ainda que dizendo ser possível relacionar a responsabilidade coletiva a militares que matam soldados rebeldes, exércitos que dizimam populações em invasões e governos – outra comparação, a nosso ver, completamente descabida – assume:

“Apoio a visão de que qualquer um que se associa e coopera com outros por uma causa comum deve: coordenar suas ações com a de seus companheiros e não fazer nada que prejudique o ação dos outros e, portanto, a causa comum; respeitar os acordos feitos – exceto quando pretendem deixar a associação por diferenças de opinião, mudança de circunstâncias ou conflito sobre métodos escolhidos tornam a cooperação impossível ou imprópria. Assim, eu sustento que aqueles que não sentem nem praticam tais deveres têm de ser expulsos da associação.”[62]

Ele complementa sua relativização dizendo que “talvez, falando de responsabilidade coletiva, você se refira precisamente ao acordo e à solidariedade que devem existir entre os membros de uma associação” e enfatizando que, se fosse esse o caso, “logo alcançaríamos a concordância”.[63]

Makhno, na resposta seguinte, volta a afirmar que “a ação anarquista em grande escala só pode alcançar resultados se possui uma base organizativa bem definida, inspirada e guiada pelo princípio da responsabilidade coletiva dos militantes”.[64]

Malatesta chega a afirmar, algum tempo depois, que a responsabilidade é essencialmente individual: “a responsabilidade moral (pois no nosso caso não pode senão tratar-se de responsabilidade moral) é individual pela sua própria natureza”.[65] E mais: “Se entre homens que se puseram de acordo para fazer alguma coisa, algum destes, faltando ao seu compromisso, faz fracassar a iniciativa, todos dirão que é ele o culpado e portanto o responsável, e não aqueles que fizeram até ao fim tudo o que deviam fazer.”[66]

Em suma, pode-se dizer que há alguns pontos de acordo e outros de divergência nessa polêmica entre Malatesta e os redatores de Dielo Truda. Malatesta não abre mão de que a responsabilidade é essencialmente individual, ainda que compreenda a necessidade de ações coordenadas, acordo e respeito destas ações e destes acordos por parte dos membros da organização anarquista. Para Makhno e Arshinov, a responsabilidade é individual e coletiva, vincula necessariamente militante e organização, fazendo um responsável pelo outro, e relaciona-se à função de guia do anarquismo no processo revolucionário. Há, conforme nota o próprio Malatesta[67] , uma incompatibilidade entre a noção de responsabilidade coletiva e a posição de completa independência e autonomia que ele mesmo defende.

Outra divergência relaciona-se à necessidade maior ou menor de unificação dos anarquistas: ao passo que os russos defendem que a organização anarquista deve reunir a maioria, senão todo o setor organizado e revolucionário dos anarquistas – enfatizando a “grande necessidade de uma organização que [reúna] a maioria dos participantes do movimento anarquista”[68] –, Malatesta afirma: “abandonemos, portanto a ideia de reunir todos numa única organização”. Ao passo que a fragmentação para os russos constituía um problema central, ela parece não ser tão essencial para Malatesta.

Há ainda divergências muito importantes em relação à organicidade – ou seja, o funcionamento orgânico desse agrupamento de anarquistas –, que envolve o nível de compromisso e autonomia dos membros e grupos que pertencem à organização em relação às decisões coletivas e o método decisório utilizado para deliberação.

Para Makhno e os russos, seria fundamental a atuação com uma estratégia e um programa claros que, mais do que princípios anarquistas, estabelecesse um caminho comum e unitário para o conjunto da organização: “esse papel [dos anarquistas na revolução] só pode ser desempenhado com sucesso quando nosso partido é ideologicamente homogêneo e unificado à partir do ponto de vista das táticas”.[69] Makhno afirma ainda: “nosso Partido deve [...] definir sua unidade política e seu caráter organizativo”[70] ; posição similar ao que Arshinov chamou de “programa teórico e prático homogêneo”[71] , o qual, deliberado coletivamente, seria obrigatório para todos seus membros.

Para Malatesta, todos os membros e grupos da organização deveriam ter a mais completa autonomia: as decisões não seriam obrigatórias, mas apenas recomendações que poderiam ou não ser seguidas: “total autonomia, total independência e, portanto, total responsabilidade de indivíduos e grupos”, sendo que as decisões congressuais dessa organização “não são regras obrigatórias mas sugestões, recomendações, propostas”. Malatesta chega mesmo a elevar essa posição – a nosso ver relacionada à estratégia organizativa – à condição de princípio do anarquismo, quando enfatiza os “princípios da autonomia e da livre iniciativa que os anarquistas professam”[72] , o que não nos parece verdadeiro desde um ponto de vista histórico.

Arshinov questiona: “Qual seria o valor de um congresso que só faria emitir ‘opiniões’ e que não se encarregaria de realizá-las na vida? Nenhum. Em um vasto movimento, uma responsabilidade unicamente moral e não-organizacional perde todo o seu valor.”[73] Aborda, indiretamente, a questão da responsabilidade coletiva anteriormente discutida.

Quando trata de assuntos relacionados ao programa da organização anarquista, Malatesta os relaciona mais com os princípios anarquistas do que com uma estratégia bem definida. Ele chega a afirmar, distintamente dos textos de 1897, que o partido anarquista é “o conjunto dos que estão do mesmo lado, que têm as mesmas aspirações gerais, que de uma maneira ou de outra lutam pelo mesmo fim contra adversários e inimigos comuns”; ou seja, esse partido seria conformado quase automaticamente, pelo simples fato de existirem anarquistas, “partidários” do anarquismo.

Makhno e os russos defendem que, para a conformação de uma estratégia coerente e de um programa para a organização anarquista, em caso de divergência nas posições, adote-se a votação por maioria, sendo o conjunto da organização vinculado completamente às deliberações e obrigado a cumpri-las – se decidir permanecer na organização, visto que há direito pleno de cisão.

Malatesta critica as decisões por maioria e propõe que as divergências sejam ajustadas voluntariamente, por meio de um certo tipo de consenso-dissenso, que dependeria do bom senso da militância em contribuir com o andamento das atividades organizativas: “adaptação [que] deve ser recíproca, voluntária e derivar da consciência da necessidade de não paralisar a vida social por mera teimosia”. Trata-se, para ele, de trabalhar com um programa amplo, em torno dos princípios anarquistas, que permita a cada membro e grupo da organização colocar quaisquer ações em prática que julguem estar contribuindo para este programa.


Malatesta, mais próximo da Síntese ou da Plataforma?

Como as obras completas de Malatesta não estão ainda publicadas, sequer em italiano, teremos de esperar até que isso seja feito para aprofundar as discussões sobre as posições de Malatesta: quais foram majoritárias, quais foram minoritárias, se essas posições podem ser relacionadas a períodos determinados de sua vida etc.

O que se pode concluir, por ora, é que, conforme afirmamos, há posições variadas que permitem diferentes interpretações; especificamente no que diz respeito ao debate Plataforma-Síntese, pode-se, sem grandes dificuldades, aproximar suas posições de um ou outro campo, a depender dos textos e trechos tomados em consideração.


Debate, impacto histórico da Plataforma e domínio da interpretação sintetista

A desconfiança de grande parte dos anarquistas em relação aos elementos que culminariam na formalização da Plataforma começou em 1923, logo após a publicação do livro A História do Movimento Makhnovista, de Arshinov.[74] Ela foi difundida em pouco tempo por meio das redes políticas que os anarquistas faziam parte.

Marc Mrachny, ex-membro da organização Nabat que passou alguns dias com os makhnovistas, publicou uma série de críticas a eles, em julho de 1923, no periódico Via Operária, órgão dos anarco-sindicalistas russos editado em Berlim. Escreveu ele que o papel de Makhno foi supervalorizado por alguns anarquistas em detrimento da classe trabalhadora e que a makhnovitchina constituiu uma espécie de “anarquismo militar”. No mesmo número da revista, Mrachny escreveu uma resenha do livro de Arshinov, que havia causado certo desconforto em função da crítica realizada a determinados setores “intelectuais” do movimento anarquista.[75] O último capítulo deste livro de Arshinov, intitulado “A Makhnovitchina e o Anarquismo”, possui vários elementos que posteriormente serão aprofundados pelos membros de Dielo Truda e expostos na Plataforma. Possivelmente, esta é a primeira contribuição que dará origem à Plataforma alguns anos depois.[76]

Em março de 1924, foi a vez do anarquista V. Judoley comparar pejorativamente os anarquistas russos aos socialistas de esquerda, que atuavam por meio de uma organização política hierarquizada. Em outro artigo crítico, escrito por E. Z. Dolinin (Moravsky), os sovietes livres da Ucrânia foram considerados uma forma de Estado, que “convém muito bem ‘aos mais honestos marxistas bolcheviques do que aos anarquistas’”. À crítica realizada por Arshinov, de que parte considerável dos anarquistas não participou da insurreição na Ucrânia, Moravsky respondeu que o “anarquismo não pode apoiar-se em baionetas, não pode ser senão o produto da cultura espiritual da humanidade.”[77]

Como se pode perceber, as críticas à makhnovitchina, fenômeno oriundo da luta popular ucraniana e dos anarquistas naquela região, foram geralmente descabidas e refletem um desconhecimento não somente do episódio histórico em questão, mas mesmo do próprio anarquismo. Tais críticas equivocaram-se ao tentar desvincular os makhnovistas da tradição anarquista, em função da utilização da violência revolucionária, visto que esta foi utilizada por praticamente todos os anarquistas que se envolveram em episódios revolucionários na história. Essa violência constituiu-se, ao mesmo tempo, como resistência aos ataques de seus múltiplos inimigos e como ferramenta para impulsionar seu programa revolucionário anarquista. Essas e outras críticas ao movimento makhnovista foram respondidas por Arshinov e Makhno, em longos artigos. Elas foram responsáveis por gerar desagradáveis polêmicas no interior do anarquismo internacional, especialmente o europeu.

As críticas aos setores intelectuais anarquistas não foram exclusividade de Arshinov. Anatol Gorelik – anarquista russo, que se exilou na Argentina em 1922 e que contribuiu de Buenos Aires com Dielo Truda – publicou em junho do mesmo ano Os Anarquistas na Revolução Russa. Além de um apanhado geral sobre os eventos na Rússia, ele criticou os intelectuais anarquistas que se isolaram do movimento dos trabalhadores.[78]

Com a publicação da Plataforma em 1926, o debate que vinha se dando em relação ao processo revolucionário russo e ucraniano e as contribuições escritas de seus membros pôde ser aprofundado; além disso, seus defensores tiveram melhores condições para buscar a concretização de seu projeto organizativo.

Um profundo debate, possivelmente o maior na história acerca da organização anarquista, durou até o início dos anos 1930. Contou com a participação não somente de Makhno e Malatesta, mas Arshinov, Volin, Luigi Fabbri, Camilo Berneri, Sébastien Faure, Maria Isidin, G. P. Maximoff entre outros. Ao passo que os membros de Dielo Truda explicavam e aprofundavam as linhas da Plataforma, os outros anarquistas, em geral, a criticavam. Como no debate entre Makhno e Malatesta, algumas destas críticas demonstravam divergências reais e outras fundamentavam-se em mal-entendidos ou mesmo em disparates grosseiros.[79]

Dentre esses absurdos, encontram-se as posições de Volin e outros sintetistas que, em 1927, concluíam que a Plataforma constituía um “revisionismo em direção ao bolchevismo, escondido pelos autores”.[80] Posição esta que, apesar de não possuir fundamento, foi adotada posteriormente por vários anarquistas e estudiosos do anarquismo.

Na tentativa de concretizar seu projeto organizativo, em 1927, os anarquistas de Dielo Truda lançaram um chamado para a constituição de uma federação internacional a partir das bases da Plataforma. Para tanto, realizaram, em 5 de fevereiro de 1927, uma reunião preliminar em Paris, com o objetivo de articular uma conferência internacional naquele mesmo ano. Participaram desta reunião militantes de Bulgária, China, Espanha, França, Itália, Polônia e Rússia. Uma comissão provisória foi formada pelos anarquistas Chen (chinês), Makhno (ucraniano) e Ranko (polonês).

Circulares foram enviadas a diversos grupos anarquistas. A conferência internacional ocorreu efetivamente em 20 de abril de 1927, também em Paris. Ao final do encontro, os militantes chegaram a alguns acordos: reconhecer a luta de classes como o aspecto mais importante da idéia anarquista, o anarco-comunismo como base do movimento e o sindicalismo como principal método de luta; reconhecer a necessidade de uma união geral dos anarquistas baseada na unidade tática, ideológica e na responsabilidade coletiva e, além disso, a necessidade de um programa positivo para realização da revolução social.

No entanto, a conferência sofreu um grande revés: a polícia invadiu e prendeu todos os presentes. Makhno só não foi deportado devido a uma campanha feita pelos anarquistas franceses. Mesmo com as propostas estabelecidas, muitos grupos, inclusive dos participantes desta conferência, não puderam ou não conseguiram levar a cabo as resoluções tiradas no encontro.[81]

Apesar disso, houve alguns resultados práticos dessas iniciativas. Na França, os plataformistas foram responsáveis pela transformação, em 1927, da Union Anarchiste Communiste em Union Anarchiste Communiste Révolutionnaire, cujas posições eram majoritárias na organização, que durou três anos; eles também criaram a Fédération Communiste Libertaire, cuja existência deu-se entre 1934 e 1936.[82]

Na Itália, os plataformistas criaram a União Anarquista Comunista, de existência breve. Ainda assim, a experiência mais relevante do período foi levada a cabo na Bulgária, quando a Federação dos Anarco-Comunistas da Bulgária (FAKB), fundada em 1919, adotou a Plataforma um pouco após sua publicação, a qual serviu para subsidiar sua prática política. A experiência do plataformismo búlgaro destacou-se entre os grandes episódios do anarquismo durante as décadas de 1920 e 1940 e envolveu uma expressão de massas considerável, abarcando sindicalismo urbano e rural, cooperativas, guerrilha e mobilização de juventude.[83] A Plataforma da Federação dos Anarco-Comunistas da Bulgária, publicada em 1945, possui influência direta da Plataforma e aborda “questões cruciais em termos de tática e organização, rejeitando a forma de organização em partido político” e subsidiou um movimento que “tinha clareza significativa para defender-se dos bolcheviques”, mas foi dizimado pelo stalinismo e pelo fascismo.[84]

Esse debate ressurgiu com força entre os anarquistas depois da Segunda Guerra Mundial, mais significativamente na França e na Itália. A Plataforma influenciou tanto a Fédération Communiste Libertaire (FCL), francesa, como os Gruppi Anarchici di Azione Proletaria (GAAP), italianos, ambos dos anos 50 e que se coordenaram numa Internacional Comunista Libertária de inspiração plataformista.[85]

O caso da Federação Anarquista francesa/francófona (FAF) foi o mais emblemático, no que se refere às consequências desse debate organizativo. Fundada em 1945, a FAF tomava como base organizativa a Síntese de Sébastien Faure e possuía diferentes tendências em seu seio: individualistas, humanistas, sindicalistas, comunistas libertários entre outros.[86] A partir de 1950, uma tendência encabeçada por Georges Fontenis e influenciada pela Plataforma passou a reunir-se sem o conhecimento dos demais e fundou a Organisation Pensée et Bataille (OPB), uma organização secreta cujo objetivo era dar à FAF uma direção revolucionária, afastando dela aqueles contrários à luta de classes e ao anarquismo social.[87]

Nos três anos posteriores à sua fundação, a OPB cresceu em influência e, no Congresso de Paris, em 1953, já sem muitos de seus membros, a FAF tornou-se, por influência dos plataformistas, Fédération Communiste Libertaire (FCL), e adotou o “Manifesto Comunista Libertário” de Fontenis, também inspirado na Plataforma, como documento programático.[88] Sua existência foi relativamente breve e, entre 1956 e 1957, a FCL encerrou suas atividades, principalmente em função da Guerra de Independência da Argélia de 1954, na qual seus militantes tomaram parte, da repressão, da ascensão do Partido Comunista Francês e de seus próprios equívocos.[89]

No entanto, tal processo não se deu sem imensos traumas, especialmente em função da exclusão dos membros da FAF, que envolveu todos seus fundadores, e do modo como se constituiu a OPB e como ela fez valer suas ideias. Já nos fins de 1953, a FAF reconstituiu-se retomando a proposição sintetista e a disputa com a FCL permaneceu até seu fim.[90] Além da incorporação de elementos teóricos do marxismo, tais como o materialismo dialético[91] , o que já seria controverso, a FCL envolveu-se em dois episódios mais complicados. O primeiro, ao decidir, em 1955, apresentar candidatos para a campanha eleitoral de 1956, fato que, mesmo sendo posteriormente objeto de autocrítica de seus membros, rendeu na época críticas tanto por parte dos sintetistas quanto cisões de setores plataformistas importantes, como aqueles que conformaram em seguida os Groupes Anarchistes d’Action Révolutionnaire (GAAR) e o periódico Noir et Rouge. O segundo, a proximidade com André Marty, que se candidatou às eleições de 1956 junto com Fontenis e outros da FCL. Marty era um ex-membro do Partido Comunista Francês e, durante a Revolução Espanhola, havia ficado responsável pelas Brigadas Internacionais e ordenado a matança de dezenas de anarquistas.[92]

Na Itália, a constituição dos Gruppi Anarchici di Azione Proletaria (GAAP) foi levada a cabo por um setor plataformista da Federação Anarquista Italiana. Expulso em 1950, este setor – que criticava o reformismo e o idealismo da organização de origem e propunha a criação de um partido anarquista inspirado pela Plataforma – continuou sua atuação como GAAP até 1956, quando se fundiu com outros grupos marxistas para conformar a Azione Comunista, setor à extrema-esquerda do Partido Comunista Italiano que contribuiu, em seguida, com a conformação do Movimento della Sinistra Comunista.[93]

Apesar dessas questões, tanto o plataformismo francês como italiano tiveram desdobramentos ulteriores, influenciando organizações que existem até o presente e que se inscrevem, em sua ampla maioria, dentro do campo anarquista.

Não é difícil prever as consequências das análises do plataformismo francês e italiano desse período e sua generalização para todos os setores do anarquismo inspirados no dualismo organizacional em geral e na Plataforma em particular. Apesar das virtudes dos projetos em questão – e não há dúvidas de que há contribuições relevantes no campo teórico e prático por parte dos plataformistas franceses e dos italianos dos anos 1950 –, nos parece claro que parte significativa deles, em especial nos casos da FCL e do GAAP, implicou graves problemas. O modo de constituição e de atuação da OPB, a posição em favor das eleições da FCL e sua aproximação com um comunista autoritário do porte de Marty e a fusão do GAAP com os marxistas são exemplos que, mesmo constituindo parte de um contexto específico, romperam com os princípios e a estratégia anarquistas enunciados na Plataforma.

E, sem dúvidas, municiaram os adversários da Plataforma de poderosos argumentos. Se a polêmica da Plataforma foi complicada em sua época, envolvendo os problemas anteriormente apresentados, e se, desde sua publicação, foi acusada por seus detratores de ser um desvio bolchevique, os casos francês e italiano reforçaram essas críticas.

Abstendo-se de uma análise menos ideologizada da Plataforma, de uma comparação entre seus elementos fundamentais e os clássicos anarquistas e esquecendo-se voluntariamente do caso do plataformismo búlgaro[94] , os sintetistas terminaram generalizando esses exemplos, especialmente o chamado “caso Fontenis” [L’ affaire Fontenis], na França, e colocando-os como típicos do modus operandi plataformista.

Constituiu-se, assim, o argumento que passou a equiparar, em grande parte dos casos, o dualismo organizacional bakuniniano[95] e plataformista, a um tipo de desvio marxista e/ou bolchevique no anarquismo, a um tipo de anarcobolchevismo. O domínio interpretativo da Plataforma por parte dos sintetistas franceses e a difusão desse argumento, por via oral e escrita, explicam como tais posições se consolidaram acriticamente pelo mundo, entre pesquisadores e militantes.


Concluindo

Mesmo que o dualismo organizacional não tenha sido defendido pela maioria dos anarquistas organizacionistas, ele possui representantes de inquestionável importância e envergadura entre os anarquistas: Bakunin, Malatesta e os redatores de Dielo Truda, dentre os quais se encontram Makhno e Arshinov.

Bakunin levou a cabo uma práxis a partir do fim dos anos 1860 que, tomada em conta desde seus aspectos teóricos e práticos, abarca a Aliança da Democracia Socialista e a Associação Internacional dos Trabalhadores, e permite extrair importantes contribuições para o debate em torno da organização política anarquista. São,a nosso ver, estas posições que constituem os fundamentos basilares da Plataforma do Dielo Truda. Malatesta também possui posições que se aproximam da Plataforma, ainda que, conforme colocamos, isso não ocorra em todos seus escritos sobre o tema. Ele não somente apresenta divergências em relação à algumas questões da Plataforma, mas, em variados momentos, chega a se aproximar da Síntese.

Levando em conta o papel de Bakunin e de Malatesta no anarquismo e mesmo o de figuras como Makhno e Arshinov, parece impossível querer equiparar suas posições a algum tipo de desvio leninista/bolchevique ou a um suposto “anarcobolchevismo”. Por uma questão lógica, afirmar que a Plataforma possui posições autoritárias significa imputar a mesma responsabilidade a Bakunin. E, sem dúvida alguma, parece-nos bastante evidente que ambos são anarquistas e que suas posições acerca da organização política anarquista são plenamente conciliáveis com suas outras posições.

Ao analisar o debate entre Malatesta e Makhno/Arshinov podemos concluir o seguinte. Como afirmamos, não há dúvida que as posições em questão são anarquistas, que elas estão de acordo sobre a necessidade de se organizar os anarquistas em dois níveis – como trabalhadores nos movimentos populares de massas e como anarquistas nas organizações políticas revolucionárias – e sobre o dever dos anarquistas de influenciar o máximo possível os trabalhadores em geral. Ao mesmo tempo, consideramos descabidas as críticas de Malatesta de que a Plataforma estaria propondo um modelo hierárquico de organização e de que o Comitê Executivo proposto por ela teria como função controlar as decisões da organização.

De qualquer forma, é possível identificar ao menos três divergências reais entre Malatesta e Makhno/Arshinov, que envolvem as seguintes questões: responsabilidade individual e coletiva, problema da fragmentação e necessidade de união dos anarquistas, nível de autonomia e independência de indivíduos e grupos na organização anarquista. Se para Malatesta a responsabilidade é essencialmente individual, para Makhno e Arshinov ela é individual e coletiva, vinculando ao mesmo tempo militante e organização. Se para Malatesta a fragmentação dos anarquistas não é problema de primeira ordem, para Makhno e Arshinov esta fragmentação deve ser superada a todo custo, permitindo a união do maior número de anarquistas possível, desde que estejam de acordo com o programa e a estratégia da organização. Se para Malatesta os indivíduos devem ter as mais amplas autonomia e independência nos grupos e estes nas federações, para Makhno e Arshinov a unidade de ação é fundamental, ainda que atingida se for necessário, por meio de votação da maioria.

Finalmente, devemos dizer que, para nós, há um nexo entre determinadas posições de Bakunin, de Malatesta e da Plataforma, que permitem conformar uma potente teoria da organização política anarquista e que serviu de inspiração para experiências políticas importantes. No caso específico da Plataforma, ela inspirou um conjunto considerável de práticas políticas anarquistas e, conforme apontado, as experiências francesas e italianas dos anos 1950, apesar de suas virtudes, ofereceram elementos para o argumento do “desvio bolchevique” que vinha sendo pregado desde que a Plataforma foi publicada. Considerando a análise ideologizada do debate e os casos em questão, e adicionando o domínio francês na discussão do tema, temos a explicação do porquê a Plataforma tem sido considerada como um elemento bolchevizante do anarquismo, ou mesmo algo estranho à tradição anarquista. O que procuramos mostrar que não possui qualquer fundamento.

No Brasil, ainda que haja notícias sobre o recebimento de Dielo Truda pelos anarquistas russos sediados no Rio Grande do Sul[96] , a Plataforma parece não ter sido discutida naquele momento e nas décadas posteriores. Mesmo havendo variadas posições de anarquistas ao longo do século XX que possuem similaridades com as noções esposadas na Plataforma[97] , foi somente entre o fim dos anos 1990 e o início dos 2000 que o texto foi lido, traduzido e discutido pela militância brasileira.[98] Quem encabeçou o debate foram aqueles que estavam envolvidos com o especifismo anarquista, influenciado pela Federação Anarquista Uruguaia que, se não conheceu a Plataforma em sua constituição, chegou, por meio das posições de Bakunin e Malatesta a concepções bastante similares.

Sem dúvida alguma, a reflexão sobre a Plataforma não deve ser tomada como um guia inflexível para a estruturação de uma organização política. Mas rejeitá-la sob o falso argumento de que esta configuraria um “desvio autoritário” no anarquismo ou que suas contribuições estariam apenas circunstritas a um contexto específico é ignorar todos os debates políticos organizativos anteriores e posteriores a este documento, que conectam a discussão organizativa anarquista a um longo fio condutor. Juntamente com outras contribuições – como nos casos específicos de Bakunin e Malatesta, mas também de muitas outras elaborações distintas, tanto teóricas quanto práticas –, entendemos ser possível avançar no debate acerca da organização política anarquista. Continuar a trabalhar no sentido de aprofundar esse debate parece-nos uma necessidade premente.


Notas:

1. CORRÊA, Felipe; SILVA, Rafael V. “Introduction à l’Édition Francophone”. In: FARJ. Anarchisme Social et Organization. Lyon: Brasero Social, 2013.

2. Há duas traduções da Plataforma em português no Nestor Makhno Archive [http://www.nestormakhno.info/portuguese/index.htm]. Uma delas foi publicada em: MAKHNO, Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001. Uma tradução definitiva em português está sendo preparada e deve ser publicada em breve.

3. SCHMIDT, Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame: the revolutionary class politics of anarchism and syndicalism. Oakland: AK Press, 2009.

4. LEVAL, Gaston. Bakunin, Fundador do Sindicalismo Revolucionário. São Paulo: Imaginário/Faísca, 2007.

5. Cf., por exemplo: BERTHIER, René. “Bakounine: une théorie de l’organisation”. In: Monde Nouveau, 2012. Idem. “Postface”. In: ANTONIOLI, Maurizio. Bakounine: entre syndicalisme révolutionnaire et anarchisme. Paris: Noir et Rouge, 2014.

6. Nas últimas décadas, o constrangimento dos anarquistas franceses com parte da obra de Bakunin é notável, especialmente no que diz respeito ao tema da organização política. Praticamente nenhum dos numerosos programas da Aliança da Democracia Socialista foi incluído nos livros publicados deste anarquista. Talvez isso possa ser explicado pela hipótese de René Berthier, relatada numa palestra de 2014 no Brasil. Para ele, durante muito tempo, os franceses aproximaram Bakunin do marxismo ou mesmo de um suposto “marxismo libertário” defendido por Daniel Guérin. Poder-se-ia justificar, assim, ainda segundo ele, o fato de uma revista como Itineraire, que dedicou seus números aos “grandes anarquistas” da história, não ter um número sobre Bakunin. É o próprio Berthier que, em certa medida, e junto com alguns outros pesquisadores e militantes, tem retomado mais recentemente a discussão da obra bakuninana.

7. A maior realização histórica concreta de militantes que estiveram envolvidos com a ADS foi a criação da AIT em países onde ela ainda não existia e o estabelecimento de novas seções da Internacional onde ela já estava em funcionamento; tais foram os casos da Espanha, da Itália, de Portugal e da Suíça, além de casos na América Latina, estimulados por correspondências. Cf. CORRÊA, Felipe. Surgimento e Breve Perspectiva Histórica do Anarquismo (1868-2012). São Paulo: Biblioteca Virtual Faísca, 2013.

8. BAKUNIN, Mikhail. “Carta a Morago de 21 de maio de 1872”. In: CD-ROM Bakounine: Ouvres Completes, IIHS de Amsterdã, 2000.

9. Idem. “Carta a Cerretti de 13-27 de março de 1872”. In: CD-BOC.

10. Idem. “Status Secrets de l’Alliance: programme et objet de l’organization révolutionnaire des frères internationaux”. In: CD-BOC. Idem. “Carta a Cerretti de 13-27 de março de 1872”. In: CD-BOC. Idem. “Carta a Morago de 21 de maio de 1872”. In: CD-BOC.

11. Idem. “Status Secrets de l’Alliance: organization de l’Alliance des frères internationaux”. In: CD-BOC. Idem. “Status Secrets de l’Alliance: programme et objet de l’organization révolutionnaire des frères internationaux”. In: CD-BOC.

12. Idem. “Carta a Morago de 21 de maio de 1872”. In: CD-BOC.

13. Deve-se ressaltar que, durante sua longa trajetória anarquista, que abarca mais de 60 anos, Malatesta defendeu diferentes posições acerca da organização política anarquista. Se em alguns casos elas aproximam-se das concepções de Bakunin e, conforme argumentaremos, da Plataforma, em outras elas possuem mais relação com a Síntese.

14. É preciso destacar que o termo “partido”, utilizado por Malatesta neste período, deve ser colocado em seu contexto histórico. Ele passa a ser gradativamente abandonado pelos anarquistas, principalmente após a Revolução Russa de 1917, quando se vincula mais diretamente ao bolchevismo e a outras iniciativas que pretendem conquistar o Estado, seja por meio de revolução ou eleições.

15. MALATESTA, Errico. “A Organização II”. In: Escritos Revolucionários. São Paulo: Imaginário, 2000, pp. 55-56.

16. Idem. “Enfim” O que é a ‘Ditadura do Proletariado”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas. São Paulo: Cortez, 1989, p. 87.

17. Idem. “Ação e Disciplina”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas, p. 24.

18. Idem. “A Organização II”. In: Escritos Revolucionários, p. 62.

19. Idem. “La Propaganda Anarquista”. In: RICHARDS, Vernon (org.). Malatesta: pensamiento y acción revolucionarios. Buenos Aires: Tupac, 2007, pp. 170-172.

20. Idem. “Programa Anarquista”. In: Escritos Revolucionários, p. 14.

21. Idem. Ideología Anarquista. Montevidéu: Recortes, 2008, p. 193.

22. Ibidem.

23. Ibidem, p. 31.

24. Idem. “Programa Anarquista”. In: Escritos Revolucionários, p. 26.

25. À despeito da forma leninista de partido estar dada pelo menos desde 1902, na obra O Que Fazer? de Lênin, esse modelo só será internacionalmente divulgado após a Revolução Russa de 1917.

26. LÊNIN, V. I. O Que Fazer? São Paulo: Hucitec, 1988.

27. Qualquer pesquisador sério se horrorizaria ao ouvir essa caracterização dos membros de Dielo Truda. Na referida palestra realizada em 2014, por exemplo, o pesquisador René Berthier (que, além de um pesquisador sério é membro de uma organização sintetista) foi enfático quando escutou tal caracterização ser realizada por outro sintetista, afirmando: “isso não existe”.

28. DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”. In: MAKHNO, Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001.

29. SCHMIDT, Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame. MINTZ, Frank. “Contexto de la Plataforma”. In: Anarkismo.net, 2007.

30. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 256.

31. Grande parte dos textos do debate estão no Nestor Makhno Archive [http://www.nestormakhno.info]. Dentre os anarquistas que contribuíram com esse amplo debate, encontram-se: Malatesta, Makhno e os próprios autores da Plataforma – Piotr Arshinov, Ida Mett, Jean Walecki, Benjamin Goldberg (Ranko) –, além de G. P. Maximoff, Volin, Senya Fleshin, Camilo Berneri, Luigi Fabbri, Sébastién Faure, Maria Isidin e outros.

32. Há dois textos históricos homônimos que, mesmo possuindo diferenças bem significativas, fundamentaram teoricamente a “síntese anarquista”. FAURE, Sébastien. “A Síntese Anarquista”. In: Anarkismo.net, 2009. VOLIN. “A Síntese Anarquista”. In: RAYNAUD, Jean-Marc. Apelo à Unidade do Movimento Libertário. São Paulo: Imaginário, 2003.

33. MALATESTA, Errico. “A Organização I”. In: Escritos Revolucionários. Idem. “A Organização II”. In: Escritos Revolucionários.

34. Idem. Ideología Anarquista.

35. Idem. “Communism and Individualism”. In: The Anarchist Revolution: polemical articles 1924-1931. Londres: Freedom Press, 1995.

36. Idem. “Individualism and Communism in Anarchism”. In: The Anarchist Revolution.

37. ANTONIOLI, Maurizio (org.). The International Anarchist Congress: Amsterdam (1907). Edmonton: Black Cat, 2009.

38. MALATESTA, Errico. “Individualism and Communism in Anarchism”. In: The Anarchist Revolution. pp. 14; 18.

39. Ibidem, pp. 19; 21.

40. Idem. “Intervention, 6th Session”. In: ANTONIOLI, Maurizio (org.). The International Anarchist Congress, p. 96.

41. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 250.

42. O conjunto dessa correspondência é o seguinte: MALATESTA, Errico. “Um Projeto de Organização Anarquista” ou “Anarquia e Organização”; “Resposta de Malatesta a Nestor Makhno”, que podem ser encontrados no Nestor Maknho Archive [http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.htm] e em MALATESTA, Errico. Autoritarismo e Anarquismo. São Paulo: Imaginário, 2004. MAKHNO, Nestor. “Resposta a ‘Um Projeto de Organização Anarquista’” [http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.h...akhno]; “Uma Segunda Carta a Malatesta” [http://www.anarkismo.net/article/25241]. O artigo “A Propósito da Responsabilidade Coletiva” [http://www.nestormakhno.info/portuguese/mala_reply_pt.h...esta3] também pode ser útil.

43. Alexandre Skirda, tradutor russo, foi responsável pela publicação da nova tradução da Plataforma ao francês, além de parte do debate que a envolve; sobre a questão da tradução original da Plataforma, ele afirma: “Lembremos que a primeira tradução efetuada por Volin fora contestada por ser ‘ruim e pesada’, o tradutor não tendo ‘tomado cuidado de adaptar a terminologia, as frases ao espírito do movimento francês’. [Le Libertaire 106, 15/04/1927] Procuramos saber a que podiam aplicar-se essas censuras e encontramos, com efeito, vários termos conscientemente deformados: napravlenie, que significa tanto ‘direção’ como ‘orientação’, foi sistematicamente empregado no primeiro sentido; idem para o termo rukovodsvto, significando ‘conduta’, e o verbo que nele originou-se, ‘guiar, conduzir, dirigir, administrar’, foi também sistematicamente traduzido por ‘dirigir’. O caso é ainda mais flagrante na última frase da Plataforma, zastrelchtchik, significando ‘instigador’; foi traduzido por ‘vanguarda’. Foi assim que, por leves pinceladas, o sentido profundo do texto pôde ser alterado.” SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective: les anarchistes et l’organization de Proudhon à nos jours. Paris: A.S., 1987, pp. 245-246.

44. Podemos mencionar o caso da Confederação Nabat, que reuniu diversas organizações anarquistas. Apesar das divergências de análise entre os historiadores e os próprios anarquistas sobre a concepção organizativa e de anarquismo da Nabat, que não nos permitem ainda saber ao certo se ela aproximava-se mais da concepção da Síntese ou da Plataforma, podemos afirmar que ela, conjuntamente com a experiência da Revolução Russa e Ucraniana, contribuiu para as linhas gerais da Plataforma. Cf. ARSHINOV, Piotr. Historia del Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008.

45. MALATESTA, Errico. “Um Projeto de Organização Anarquista”.

46. A discussão entre Malatesta e Makhno também foi bastante complicada por problemas terminológicos; as questões de tradução anteriormente apontadas contribuíram com isso.

47. MALATESTA, Errico. “Resposta de Malatesta a Nestor Makhno”.

48. MAKHNO, Nestor. “Uma Segunda Carta a Malatesta”.

49. DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”.

50. Idem. “Suplemento a la Plataforma Organizativa (Preguntas y Respuestas), Nestor Makhno Archive.

51. MAKHNO, Nestor. “Resposta a ‘Um Projeto de Organização Anarquista’”.

52. DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”.

53. Ibidem.

54. Ibidem.

55. MALATESTA, Errico. “Um Projeto de Organização Anarquista”.

56. Ibidem.

57. MAKHNO, Nestor. “Resposta a ‘Um Projeto de Organização Anarquista’”.

58. Ibidem.

59. Ibidem.

60. ARSHINOV, Piotr. “O Velho e o Novo no Anarquismo”. Nestor Makhno Archive.

61. Ibidem.

62. MALATESTA, Errico. “Resposta de Malatesta a Nestor Makhno”.

63. Ibidem.

64. MAKHNO, Nestor. “Uma Segunda Carta a Malatesta”.

65. MALATESTA, Errico. “A Propósito da Responsabilidade Coletiva”.

66. Ibidem.

67. MALATESTA, Errico. “Resposta de Malatesta a Nestor Makhno”.

68. DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”.

69. MAKHNO, Nestor. “Uma Segunda Carta a Malatesta”.

70. Ibidem.

71. ARSHINOV, Piotr. “O Velho e o Novo no Anarquismo”.

72. MALATESTA, Errico. “Resposta de Malatesta a Nestor Makhno”.

73. ARSHINOV, Piotr. “O Velho e o Novo no Anarquismo”.

74. ARSHINOV, Piotr. Historia del Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008.

75. “Polemicas en Torno del Libro de Archinov: Historia del Movimiento Makhnovista”. In: ARSHINOV, Piotr. Historia del Movimiento Makhnovista. Buenos Aires: Tupac, 2008, p. 232.

76. ARSHINOV, Piotr. “A Makhnovitchina e o Anarquismo”. In: Anarkismo.net, 2015.

77. “Polemicas en Torno del Libro de Archinov”, pp. 233-234.

78. Cf. este e outros escritos do autor em MINTZ, Frank (org.). Anatol Gorelik: el anarquismo en la Revolución Rusa. Buenos Aires: Anarres, 2007.

79. Estamos trabalhando numa compilação completa das intervenções neste debate, que deverá ser publicada, em algum tempo, no site do Instituto de Teoria e História Anarquista. (ITHA).

80. VOLIN et alli. “Reply to the Platform (Synthesist)”. Nestor Makhno Archive.

81. HEAT, Nick. “Introdução Histórica”. In: DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”, Nestor Makhno Archive.

82. BERRY, David. A History of the French Anarchist Movement (1917-1945). Oakland: AK Press, 2009, pp. 174-176.

83. SCHMIDT Michael; VAN DER WALT, Lucien. Black Flame, p. 258.

84. SCHMIDT, Michael. Anarquismo Búlgaro em Armas: A Linha de Massas Anarco-Comunista. Parte I. São Paulo, Faísca, 2009, p. 40. A Plataforma dos búlgaros consta como anexo deste livro.

85. HEAT, Nick. “Introdução Histórica”. DANTON, José A. G. “Para Pensar el Anarquismo desde Nuestra Realidad: sobre el Manifiesto Comunista Libertario”. In: El Manifiesto Comunista Libertario y Otros Textos. Santiago: Pensamiento y Batalla, 2014, p. 19.

86. JOYEUX, Maurice. “L’Affaire Fontenis”. In: La Rue, num. 28. Paris: Groupe Louise Michel, 1980.

87. SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective, pp. 203-213.

88. FONTENIS, George. Manifeste du Communisme Libertaire. NEFAC, 2006.

89. DANTON, José A. G. “Para Pensar el Anarquismo desde Nuestra Realidad: sobre el Manifiesto Comunista Libertario”, pp. 19-20.

90. JOYEUX, Maurice. “L’Affaire Fontenis”.

91. SKIRDA, Alexandre. Autonomie Individuelle et Force Collective, p. 343.

92. “Organisation Pensée Bataille.” In: Noir et Rouge. Cahiers d’etudes Anarchistes Revolutionnaires: anthologie, 1956-1970. Paris, s/d. GUÉRIN, Cédric. Pensée et Action des Anarchistes en France: 1956-1970. Lille: Lille 3, 2000. JOYEUX, Maurice. “L’Affaire Fontenis”, p. 81.

93. DANTON, José A. G. “Para Pensar el Anarquismo desde Nuestra Realidad: sobre el Manifiesto Comunista Libertario”, p. 20. FdCA. Anarchist Communists: a question of class. FdCA, 2005, p. 107.

94. O plataformismo búlgaro constitui um exemplo bastante distinto dos casos francês e italiano dos anos 1950 e era conhecido na França por meio das publicações de Gr. Balkansky. Cf., por exemplo, este livro, publicado inclusive por um grupo da FAF: BALKANSKY, Gr. Histoire du Movement Libertaire en Bulgarie. Antony: Groupe Fresnes-Antony (Fédération Anarchiste), 1982.

95. Recordemos que, como apontamos anteriormente, os franceses já atribuíam um certo caráter autoritário à parte importante da obra de Bakunin.

96. RODRIGUES, Edgar; RAMOS, Renato; SAMIS, Alexandre. Against All Tyranny! Essays of Anarchism in Brazil. Londres: Kate Sharpley Library, 2003, p. 19.

97. Para uma análise das experiências dos anos 1940 a 1960 em São Paulo e no Rio de Janeiro, cf. SILVA, Rafael Viana da. Elementos Inflamáveis: Organizações e Militância Anarquista no Rio de Janeiro e São Paulo (1945-1964). Dissertação (Mestrado em História). Seropédica: UFRRJ, 2014.

98. DIELO TRUDA. “Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários”. In: MAKHNO, Nestor. Anarquia e Organização. São Paulo: Luta Libertária, 2001.


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