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Polêmica sobre a visão do PSTU sobre o anarquismo

category brazil/guyana/suriname/fguiana | a esquerda | debate author Thursday December 13, 2007 21:46author by Evandro Couto - FAG Brasil Report this post to the editors

Uma opinião da FAG

O artigo de Paulo Aguena da Direção Nacional do PSTU sobre o anarquismo emitido faz algumas semanas nos convida aqui para uma boa polêmica. Não é do nosso estilo como organização política anarquista o debate pueril e mesquinho o que nos faz, nos termos francos do dirigente desse partido, posicionar devidamente nossas idéias dentro dos temas propostos.
O Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) é uma agremiação política de linha trotskysta-morenista de expressão em todo o Brasil que hoje ocupa o posto de direção majoritária da Conlutas, uma proposta sindical que fez ruptura com a CUT.
12 anos pelo Socialismo e pela Liberdade!
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Polêmica com a visão do PSTU sobre o anarquismo.

PSTU Do ponto de vista político, os anarquistas se declaram inimigos de todo poder governamental e estatal. Sobre o Estado, Piotr A. Kropotkin (1824-1921) afirma em sua obra “O Estado e seu Papel Histórico”: “Nós vemos nele uma instituição que no transcurso de toda história de toda sociedade humana serviu para impedir a união das pessoas entre si, serviu para obstaculizar o desenvolvimento, a iniciativa local, para afogar as liberdades já existentes e estorvar o surgimento de novas liberdades. E nós sabemos que a instituição que já existiu há vários séculos e que se consolidou firmemente adotando uma forma determinada com o objetivo de cumprir determinado papel na história, não pode ser adaptada para um papel contrário”.
Assim, por um lado, o anarquismo corretamente vê que não há nenhuma possibilidade de aproveitar o aparato opressor do Estado capitalista para a emancipação dos trabalhadores e defende sua destruição; por outro, erroneamente acaba por negar toda forma de Estado. Não consegue compreender que nem toda violência organizada, nem todo Estado, constituem um dano em si mesmo.

- Aqui teríamos que separar analiticamente, para começar, o conceito Estado e violência organizada. Ainda que todo Estado supõe violência organizada nem toda violência organizada supõe Estado. Sobre o problema da violência aplicada contra os inimigos da revolução já respondia Luigi Fabbri em Dictadura y Revolución sem deixar dúvidas:

Uma coisa é a violência e outra a autoridade governamental, seja essa ditatorial ou não. Ainda que seja verdade, em efeito, que todas as autoridades governamentais se baseiam na violência, seria inexato e errôneo dizer que toda “violência” é um ato de autoridade, deduzindo disso que se é necessária a primeira se faz indispensável a segunda.

(...) É um ato de autoridade quando se adota para impor aos demais uma conduta ao gosto de quem manda, quando é emanação governamental ou patronal e serve para manter na escravidão os povos e classes (...). É, ao contrário, violência libertária, isto é, ato de liberdade e de libertação, quando é empregada contra o que manda por quem já não quer obedecer. (...) Tal violência é a revolução em ação. Mas cessa de ser libertária e por conseguinte revolucionária quando, apenas vencido o velho poder, quer ela mesma converter-se em poder e se cristaliza em uma forma qualquer de governo.

E para as caricaturas que imputam transigência com o inimigo por culpa de um discurso principista de liberdade (fora de condições históricas concretas):

Liberdade também para nossos inimigos? Nos perguntam. Com os inimigos estamos em luta, e na peleia não se reconhece ao inimigo nenhuma liberdade , nem sequer a de viver. (...) Mas nos preocupar com a liberdade de nossos inimigos quando nós temos algum pobre diário e uns poucos semanários, enquanto eles possuem centenas de diários de grande tiragem; quando eles estão armados e nós desarmados; enquanto eles estão no poder e nós somos os súditos; enquanto eles são ricos e nós pobre, seria ridículo... seria o mesmo que reconhecer a um assassino a liberdade nos matar!

A violência organizada está fora de questão, haveria que discuti-la e perguntar por sua ausência mais bem nas idéias deixadas pelo velho Engels tomadas na conformação teórica da Segunda Internacional. Onde o marxismo organiza sua variante reformista e por efeito produz a social democracia tal como a conhecemos.

O Estado certamente é o elemento que nos opõe. É uma contestação teórica e a sua vez estratégica que nos faz impugná-lo como ferramenta para chegar ao socialismo. Nossa teoria indica que o Estado não é um conjunto institucional “vazio”, que seus aparelhos estão cheios do que produz e reproduz o poder burguês, constituídos por estas relações de dominação que são uma estrutura fundamental para a conservação do sistema. O uso do Estado é dentro deste enfoque a inserção estratégica em relações de poder caríssimas a sociedade de classes, que tem mecanismos que não dão trânsito para uma revolução, que a burocratiza e a impede de realizar-se. O poder coletivo das classes trabalhadoras só pode ter calço em instituições que dão participação real nas decisões fundamentais do processo revolucionário. O poder popular está em antagonismo latente ou manifesto com o Estado, disputa seu monopólio da violência para tornar-se povo em armas contra a reação, reapropria-se da política como função coletiva contra a concentração do poder nos mandos estatais, seus técnicos e sua burocracia.

PSTU Por isso, defende a destruição do Estado capitalista e a passagem direta ao comunismo, como se fosse possível a imediata supressão das classes sociais. Não reconhece a necessidade do socialismo – fase transitória do capitalismo ao comunismo – em que a classe operária, por meio da ditadura do proletariado, deverá ainda lutar pela extinção definitiva das classes exploradoras e, por decorrência, de toda classe social.

- Com a palavra Camilo Berneri pelo periódico Guerra di Classe de 36:

Os marxistas “no se propõem a destruição completa do Estado”, mais bem prevêem a extinção natural do Estado como consequência da destruição das classes realizada pela “ditadura do proletariado” ou então pelo socialismo de Estado, enquanto os anarquistas querem a destruição das classes, mediante uma revolução social que suprima o Estado junto com as classes. Os marxistas, além do mais, não propugnam a conquista armada da Comuna por parte de todo o proletariado, senão a conquista do Estado por parte do partido que presume representar o proletariado. Os anarquistas admitem o uso de um poder político pelol proletariado, mas tal poder político é entendido como o conjunto dos sistemas de gestão comunista, dos organismos corporativos, das instituições comunais, regionais e nacionais livremente constituídas fora e contra o monopólio político de um partido, e tendendo à mínima centralização administrativa.

A experiência que reconhecemos é a que joga os órgãos de poder popular com intransigência contra as classes dominantes e o imperialismo e os seus ensejos de reação armada. Como força anarquista organizada a oposição a todo e qualquer aparelhamento burocrático ou ditatorial que usurpa o poder popular em nome dos seus interesses de grupo particular. As classes sociais serão suprimidas na mesma medida em que é liquidada a reação e o poder popular prefigurar nas suas relações sociais e políticas - como regime revolucionário - a desestruturação da sociedade de classes e o poder dominante que lhe constitui hierarquicamente.

Sobre a ditadura proletária, recorrendo a nosso teórico E. Malatesta quando discutia a revolução russa em 1922 diríamos:

(...) a “ditadura do proletariado”seria o poder efetivo de todos os trabalhadores dirigido à destruição da sociedade capitalista, e se converteria na anarquia apenas cessasse a resistência reacionária e ninguém mas pretendesse obrigar as massas a obedecer e trabalhar para outros. E então nosso dissentimento não seria mais que uma questão de palavras. Ditadura do proletariado significaria ditadura de todos, isto é, não seria mais ditadura, como governo de todos não mais governo, no sentido autoritário, histórico e prático da palavra...

Mas os partidários verdadeiros da “ditadura do proletariado” não entendem assim e isto nos fazem ver perfeitamente na Rússia. O proletariado, naturalmente, entre nela como entra o povo nos regimes democráticos, isto é, simplesmente para esconder a essência real das coisas. Na realidade se trata da ditadura de um partido, ou melhor dos chefes de um partido; e é uma verdadeira ditadura, com seus decretos, com suas sanções penais, com seus agentes executivos e sobretudo sua força armada, que hoje serve também para defender a revolução de seus inimigos externos mas que servirá amanhã para impor aos trabalhadores a vontade dos ditadores, deter a revolução, consolidar os novos interesses que tem se constituído e defender contra as massas uma nova classe privilegiada.

PSTU Ao não compreender a utilidade do Estado nas mãos do proletariado, ao se contrapor a qualquer forma de estado, os anarquistas chegaram a pegar em armas contra o governo dos sovietes durante a guerra civil na Rússia e, inclusive, organizaram um atentado contra Lênin.

- O anarquismo deu peleia nesse processo, avançou com os trabalhadores sobre os limites burgueses daquele fevereiro de 1917 com a decisão resoluta de levar a cabo um genuíno socialismo de conselhos. Desde que consumado o assalto ao palácio de inverno em outubro esteve implicado em polêmicas e sofrido retaliações. Seguramente defendia intransigente as conquistas revolucionárias mas não se filiava ao projeto político que acabara de colocar o partido bolchevique no poder. A “ditadura do proletariado” se revelou ditadura sobre o proletariado, o poder dos soviets foi tomado pela burocracia de um partido de estado. Stalin não foi um acidente de percurso, uma degeneração como preferem outros, o secretário-geral do partido comunista russo durante o governo Lênin foi o produto fiel de um regime que se permitiu uma brutal concentração de poderes por fora e separado dos trabalhadores. As fábricas e os campo mudaram de dono mas não mudaram as relações de poder. Não era a classe trabalhadora que estava no poder, era o partido.

O autor de Dez dias que abalaram o mundo John Reed, que esteve na Rússia durante a revolução narrava que:

É inegável que os anarquistas tem promovido e feito a Revolução (...)

Agregando Luigi Fabbri:

Que o certo é que os anarquistas estiveram ao lado dos bolcheviques enquanto estes não se assentaram no poder, e que juntos lutaram e venceram o czarismo primeiro e a burguesia democrática depois(...).

Quando Petrogrado tinha a suas portas a reação armada em outubro e novembro de 1919, reconhece o bolchevique Victor Serge que os militantes da Federação Anarquista já estavam na primeira linha de combate defendendo a revolução. Durante a guerra civil não pode ser omitida a guerrilha macknovista que tanta peleia deu para repelir e vencer os generais czaristas na Ucrânia e na Criméia.



PSTU Do ponto de vista econômico, de uma forma geral os anarquistas defendem a pequena propriedade. É uma concepção pequeno-burguesa da economia mercantil e constitui de fato um passo atrás em relação ao capitalismo industrial.

Enquanto o marxismo revolucionário defende a propriedade coletiva dos meios de produção e de troca (nacionalização de fábricas, terras, transportes, etc), por intermédio de um Estado operário que organize toda a economia, os anarquistas defendem a passagem direta dos meios de produção para as mãos dos trabalhadores organizados em grupos (autogestão, associações, coletividades, comunas, etc). Estes, por sua vez, deverão estabelecer relações de troca entre si. Cada empresa, no lugar de um proprietário, possuirá cem ou milhares de proprietários, mas não pertencerá à classe trabalhadora como um todo. Dessa forma, sem o Estado a economia funcionará sem direção, tal como uma economia de mercado. O anarquismo resultará num capitalismo sem capitalistas.

- Nosso programa finalista é o da expropriação da classe capitalista e a propriedade coletiva pela gestão operária dos meios de produção, bem como a extensão das medidas socialistas também para o poder político. Isso não exclui em absoluto a construção de planos para a economia, uma política de produção para atender as necessidades mais urgentes e remediar desigualdades do processo, a centralização indispensável para viabilização de certas demandas de serviços. A diferença é que propomos isso com outro critério, com dinâmicas de participação real dos trabalhadores, uma articulação de autogestão, federalismo e planificação que não guarda nenhuma semelhança com o poder da tecnocracia e da burocracia de estado vistos em “socialismo real”.

Gaston Leval concluía que:

É necessária uma certa centralização que preferimos denominar “coordenação”(...). Sobretudo a planificação que supõe a prática da concepção necessidade-produção, a única que pode responder a uma economia verdadeiramente socialista, socializada e humanista.

A ruptura socialista não é a mudança da propriedade privada para a propriedade estatal, já está tarde para reconhecer que para a classe trabalhadora o que pertence ao Estado, ainda que identificado como a coisa pública, nunca pertenceu de fato ou nunca foi administrado de fato pelos interesses dos trabalhadores. O marxismo faz do estado o único patrão, que explora como capitalista e administra o produto social nas esferas do seu domínio político-burocrático. O socialismo que defendemos no programa é a gestão direta dos trabalhadores sobre os meios de produção, na federação dos seus organismos de trabalho e na planificação democrática da economia.

Nos avisa Bakunin já nas polêmicas da Primeira Internacional sobre este programa que faz o Estado proprietário de toda economia:

Esta revolução consistirá na expropriação quer progressiva, quer violenta, dos proprietários e dos capitalistas atuais, e na apropriação de todas as terras e de todo o capital pelo Estado, que, para poder desempenhar a sua grande missão econômica tão bem como a política, deverá ser necessariamente muito forte e muitíssimo concentrado. O Estado administrará e dirigirá a cultura da terra por meio dos seus engenheiros, escolhidos, e comandado um exército de trabalhadores rurais, organizados e disciplinados para esta cultura. Ao mesmo tempo, sobre a ruína de todos os bancos existentes, ele estabelecerá uma banca única, comandatária de todo o trabalho e de todo o comércio nacional (...) Na realidade, isso seria um regime de caserna para o proletariado, em que a massa uniformizada dos trabalhadores e das trabalhadoras despertaria, adormeceria, trabalharia e viveria a toque de caixa.

PSTU Do ponto de vista da tática, ou seja, dos meios necessários para atingir os fins desejados, os anarquistas se dividem entre os pacíficos, os partidários de uma sublevação social e os que defendem uma revolução social a partir do terror individual. O traço comum de todos eles, no entanto, é o repúdio a qualquer forma de luta política – seja sob a forma da luta parlamentar ou da luta direta pelo poder. Não entendem que a luta organizada contra o capital e sua destruição por meio das forças do proletariado como classe é precisamente uma luta política levada a termo pelo partido revolucionário da classe operária.

- As variantes teóricas e táticas pertencem a todo o campo socialista – onde se inscreve o anarquismo como corrente libertária -, estão bem marcadas entre o marxismo e incluso disputam violentamente discursos de verdade dentro de suas frações internas.

A política, para além dos elementos que vão agregados em lutas sindicais e populares de outro tipo, tem seu próprio campo de ação. Está relacionada com o poder, como antagonismo, aliança ou colaboração. O que não estamos de acordo é que a política está encerrada no terreno eleitoral e no jogo parlamentar, que quem não participa positivamente desta cena não faz política e tampouco implicado nas lutas de poder. Os anarquistas fazem luta política, tem seu específico trabalho nesta esfera que compreende distintos instrumentos para lutar o presente e criar rupturas com o poder dominante, seu sistema e sua estrutura de classes.

A classe no poder é o tema estratégico pra gente e não o partido no poder. Uma nova articulação das organizações populares com a política que faça caminho para uma sociedade livre e socialista. Construir um povo forte, um movimento de trabalhadores com independência de classe e capaz politicamente é a tarefa que deriva dessa estratégia. Nessa perspectiva o partido dá impulso, produz discursos teóricos e busca vias de ação fora do núcleo duro de produção e reprodução do sistema, joga a vida com sua ideologia de mudança... trabalha incansavelmente na construção de um sujeito revolucionário operando no interior do antagonismo social de condições históricas concretas.

Evandro Couto, secretário da Federação Anarquista Gaúcha (FAG).

Related Link: http://www.vermelhoenegro.org/fag
author by ___publication date Fri Dec 14, 2007 04:21author address author phone Report this post to the editors

Pontuou bem cada questão. Os marxistas certamente sabem do anarquismo bem menos do que o contrário. O texto do PSTU é muito ruim, mas é o que se fala.
Mas um detalhe: esse artigo do PSTU é meio antigo, tem quase dois anos (digo porque o inicio do texto dá a entender ser recém publicado).

Saudações aos faguistas!

 

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